Forma mais popular da mandioca é consumida há 9 mil anos

24/04/2018 
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Domesticação da mandioca envolveu seleção de variedades com menores teores de ácido cianídrico, possibilitando o consumo
Estudo molecular sugere que a mandioca-mansa ou macaxeira tem uma história de dispersão diferente da mandioca-brava, com maiores teores de ácido cianídrico – Fotos: Alessandro Alves-Pereira via Agência Fapesp

Mandioca, mandioca-mansa, macaxeira, aipim e vários outros nomes no Brasil. Manioc ou casava nos países de língua espanhola. Existem muitas formas para designar a espécie Manihot esculenta, que produz uma raiz rica em amido e foi domesticada há cerca de 9 mil anos. Estudos genéticos e arqueológicos indicam que isso ocorreu na região do Alto Rio Madeira, no atual estado de Rondônia.

A forma como se desenrolou a transmissão do cultivo da mandioca pelas Américas ainda é algo nebuloso. Especula-se que a partir do centro original de domesticação no sudoeste da Amazônia o cultivo da mandioca se disseminou entre as etnias indígenas seguindo o curso dos grandes rios amazônicos, que são até hoje as principais vias de transporte da região.

Tal hipótese necessitava de comprovação e esse foi o objetivo de um estudo da diversidade genética feito por Alessandro Alves-Pereira, que fez doutorado no Departamento de Genética da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, e atualmente é pós-doutorando no Departamento de Biologia Vegetal da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O trabalho teve supervisão de Maria Imaculada Zucchi, pesquisadora do Instituto Agronômico (IAC), e contou com apoio da Fapesp. Resultados foram publicados nos Annals of Botany.

“A integração de estudos arqueológicos e etnobotânicos sugere que a dispersão da cultura da mandioca está ligada aos movimentos humanos pré-históricos ao longo dos rios amazônicos. A partir daí, decidimos usar técnicas de biologia molecular para buscar sinais genéticos de tal dispersão ao analisar a variação no genoma da mandioca”, disse Alves-Pereira.

O grupo – formado por outros pesquisadores da Esalq, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e da Universidade Federal do Amazonas – estudou os dois tipos de genoma de Manihot esculenta: o nuclear, que se encontra no núcleo das células, e o genoma do cloroplasto, a organela presente nas células das plantas onde é realizada a fotossíntese.

Cada genoma fornece um tipo de informação sobre a história evolutiva. O genoma do cloroplasto nas plantas angiospermas (o caso da mandioca) é geralmente transmitido de geração em geração unicamente pelo lado materno. Ou seja, ao se comparar o genoma de diversas amostras de mandioca coletadas em regiões diferentes, é possível construir árvores genealógicas da linhagem materna.

Com o genoma nuclear é diferente. Ele sofre recombinação a cada evento reprodutivo, ao mesclar partes dos genomas da planta-pai e da planta-mãe durante a fertilização do embrião.

“O genoma nuclear fornece uma ‘fotografia’ mais recente da diversidade da mandioca e revela maior variação do que o genoma do cloroplasto, mas não permite voltar muito no tempo para saber quando ocorreram as diversificações”, disse Alves-Pereira.

O material analisado veio do cultivo de agricultores familiares de 44 municípios ao longo de alguns dos principais rios amazônicos: Negro, Branco, Madeira, Solimões e Amazonas. Também foram coletadas amostras no nordeste do Pará e no sul de Rondônia.

Entre 2010 e 2015, foram coletadas amostras de folhas de 596 indivíduos, sendo 325 de mandioca-brava, 226 de mandioca-mansa, 28 da forma selvagem Manihot esculenta ssp. flabellifolia e 17 não designadas – encontradas fora de áreas de cultivo e, portanto, desassociadas do cultivo tradicional.

Manihot esculenta ssp. flabellifolia é a espécie selvagem, domesticada há 9 mil anos. “A mandioca selvagem possui raízes que acumulam amido, mas não são tão grandes quanto as raízes das formas domesticadas”, disse Alves-Pereira.

“A mandioca selvagem também difere nas formas como é encontrada na natureza. Ela cresce na forma de grandes arbustos, em ambientes mais abertos, e como trepadeiras em ambientes fechados no meio da mata. Já as mandiocas domesticadas são arbustos de 1 a 2 metros de altura, menores e menos ramificados do que os arbustos selvagens”, disse.

Mas a principal diferença entre as diversas variedades de mandioca está no grau de toxicidade. A mandioca selvagem é uma planta muito venenosa. Suas raízes possuem elevado nível de substâncias precursoras do ácido cianídrico. O consumo in natura é potencialmente letal.

A domesticação da mandioca envolveu a seleção de variedades com menores teores de substâncias tóxicas, até chegar a um produto com teores mínimos, que pudesse ser consumido praticamente sem processamento.

A mandioca vendida em feiras, quitandas e supermercados é a mandioca-mansa, conhecida também como macaxeira ou aipim. Ela ainda contém certo teor de substâncias tóxicas, por isso não pode ser consumida imediatamente após ser colhida. É necessário cortar e descascar as raízes em pequenos pedaços e cozinhá-los para que as substâncias tóxicas sejam eliminadas.

Com a mandioca-brava é diferente. Ela conserva elevado teor de precursores do ácido cianídrico. Neste caso, a domesticação da mandioca-brava envolveu o desenvolvimento pelos índios de técnicas para retirar a toxicidade da planta.

Tais técnicas envolvem procedimentos como retirar a casca da mandioca, ralar a raiz, prensar a polpa resultante para retirar as toxinas, ferver a polpa para evaporar o ácido cianídrico, ou ainda fermentá-la para a produção de cauim, a bebida alcóolica tradicional nas sociedades indígenas do Brasil.

Para entender como foi o processo de disseminação do cultivo da mandioca, era preciso descobrir como e onde as formas mansa e brava se diferenciaram a partir do ancestral selvagem.

Uma vez no laboratório, a investigação de bancada de Alves-Pereira envolveu técnicas genéticas convencionais para a extração do DNA das células das folhas de mandioca. O passo seguinte foi buscar marcadores moleculares que pudessem servir como pontos de referência na comparação do genoma das diversas linhagens.

O geneticista buscou especificamente por microssatélites, que são pequenas regiões com sequências repetitivas e que ocorrem em todo o genoma. “A partir dos microssatélites, conseguimos estudar as relações genéticas entre os indivíduos. Usamos 14 microssatélites nucleares e quatro microssatélites cloroplastidiais”, disse.
A Manihot esculenta produz uma raiz rica em amido (mandioca) – Foto: Fernando Augusto via Pixabay – CC

Diversificação e domesticação

Ao comparar os genomas dos 596 indivíduos, começaram as surpresas. A variação genética detectada entre as diversas amostras não apontou um viés biogeográfico, ou seja, o estudo do genoma nuclear das amostras não revelou a existência de variedades regionais. “Achávamos que o estudo genético das variedades de mandioca fornecesse pistas sobre a disseminação do cultivo através dos rios amazônicos. Não foi o que aconteceu”, disse Alves-Pereira.

Segundo Zucchi, a expectativa era encontrar evidências genéticas para explicar a dispersão geográfica da mandioca. “Não conseguimos detectar variação significativa entre os indivíduos coletados em diferentes rios, como esperado. O que se detectou foi uma grande diversidade entre as variedades mansas e bravas”, disse.

“Os dados apontaram, porém, um resultado esperado. A mandioca-mansa apresenta maior grau de heterozigosidade e uma divergência considerável quando comparada ao genoma da mandioca-brava”, disse Alves-Pereira.

No caso da mandioca-mansa, o maior acúmulo de heterozigotos (ou genótipos diferentes para um mesmo alelo), sugere a decorrência de um tempo mais longo de divergência da mandioca-mansa a partir da domesticação de uma mandioca selvagem.

Segundo Alves-Pereira, o menor grau de heterozigosidade observado no caso da mandioca-brava sugere que pode ter decorrido menos tempo desde a domesticação.

A evidência da menor consanguinidade para a mandioca-mansa reforça esta tese. Quanto maior ou mais antiga for a população de uma espécie ou de um grupo de indivíduos em processo de domesticação, menor será a chance de haver cruzamento entre irmãos ou primos “caso diferentes variedades sejam selecionadas para preferências distintas por agricultores diferentes”, disse Alves-Pereira.

Dado que as populações se diversificam geneticamente (por meio de cruzamentos ou mutações) ao longo do tempo, a menor consanguinidade entre os indivíduos de mandioca-mansa analisados pode ser um indicativo de um tempo maior de divergência em relação à mandioca selvagem.

“Concluímos que uma interpretação possível para os dados de variação genética, e como essa se distribui no espaço, era que a mandioca-mansa foi domesticada primeiro, há cerca de 9 mil anos, como sugerido na literatura genética e arqueológica. Só muito depois é que se domesticou a mandioca- brava. O processo de dispersão de ambas as variedades parece ter sido, portanto, bem diferente, tanto no tempo como no espaço”, disse Alves-Pereira.

A seleção pelas populações pré-colombianas de índios de variedades de mandioca selvagem com baixos teores de veneno até chegar à mandioca- mansa deve ter sido um processo mais antigo. Segundo Alves-Pereira, isso porque supõe-se que naquela época as populações amazônicas eram muito menores e nômades. Isso implica uma menor demanda de alimentos, que pode ser suprida por mandiocas-mansas manejadas perto das unidades familiares.

E quanto à mandioca-brava? Uma vez que se domesticou a mandioca-mansa, os antigos grupos de caçadores-coletores começaram a abandonar a vida nômade para se fixar em aldeias e cultivar suas mandiocas. O registro arqueológico indica que entre 4 e 3 mil anos atrás as populações pré-colombianas começaram a experimentar um aumento populacional. Para alimentar mais bocas, o cultivo de mandioca teve necessariamente que ser ampliado.

“O que se vê hoje na Amazônia é a mandioca-mansa comumente plantada no quintal da casa dos caboclos, e a mandioca-brava cultivada em áreas muito maiores: os roçados abertos na mata”, disse Alves-Pereira.

Era assim há 4 mil anos? O fato de a mandioca-brava ter sido domesticada em um momento de aumento de população das aldeias suscita uma questão ainda sem solução. Teria sido a necessidade de produzir mais alimento que obrigou os índios a procurar novas formas de alimentação, acabando em última instância por desenvolver técnicas de desintoxicação para poder consumir a mandioca-brava, ou foi a maior oferta de alimento decorrente da domesticação da mandioca-brava que possibilitou o adensamento populacional?

Esta não é uma questão que os geneticistas possam responder, mas é uma hipótese para guiar futuras escavações arqueológicas na Amazônia. De acordo com Zucchi, a pesquisa do genoma da mandioca prossegue. No momento, Alves-Pereira está analisando mais de 5 mil marcadores chamados SNPs (polimorfismo de nucleotídeo único), que estão sendo empregados para a construção de uma análise genética muito mais refinada.

O artigo Patterns of nuclear and chloroplast genetic diversity and structure of manioc along major Brazilian Amazonian rivers tem autoria de Alessandro Alves-Pereira, Charles R. Clement, Doriane Picanço-Rodrigues, Elizabeth A. Veasey, Gabriel Dequigiovanni, Santiago L.F. Ramos, José B. Pinheiro e Maria I. Zucchi.

Peter Moon / Agência Fapesp (Acesse aqui o texto original)

Estudo confirma ação positiva do látex no restauro ósseo

24/04/2018
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Utilizado com sucesso em tecidos moles, derivado da seringueira mostrou-se benéfico também no reparo de lesões no osso
Além do alto potencial de reparação óssea e da biocompatibilidade, o látex é um material nacional e de baixo custo quando comparado a outros disponíveis no mercado – Foto: Domínio público via Wikimedia Commons

Lesões em crânios de ratos ganharam novos vasos sanguíneos e boa reestruturação óssea após tratamento com o látex. Os experimentos utilizaram a F1, uma fração da proteína do látex natural (extraído da Hevea brasiliensis, a seringueira), e mostram o estímulo de fatores de crescimento para a recuperação óssea.

O achado é parte de estudo realizado por pesquisadores da USP em Ribeirão Preto e da Unesp em Araçatuba e publicado na edição de fevereiro da revista Biomedical Material. Os resultados confirmam os benefícios da proteína do látex já relatados com tecidos moles em experimentos anteriores, como a formação de vasos sanguíneos, adesão celular e formação de matriz extracelular. Mas esses são os primeiros relatos desses efeitos sobre os ossos.

Os pesquisadores analisaram a evolução de defeitos provocados por cirurgias em 112 calvárias (ossos da calota craniana) de ratos de laboratório. Esses ossos foram separados em grupos que receberam enxertos de osso (autólogos, autógenos e xenógenos – do próprio animal, da mesma espécie e de outra espécie) e também aqueles com enxertos mais a proteína F1.
Aparência histológica do centro do defeito ósseo em seis semanas de pós-operatório/ Fotomicrografias mostrando os tecidos que preencheram a área do defeito ósseo em CTL (A) e (C), AuG – F1 (B) e (D), AlG – F1 (E) e (G), XeG – F1 (F) e (H), AuG ( I), AlG (J) e XeG (K).

Abreviaturas e símbolos: asteriscos – enxerto ósseo remanescente; bv – vasos sanguíneos, tecido conjuntivo; nfb – osso neoformado; setas pretas – limite entre osso novo e enxerto ósseo remanescente – Imagem: Revista Biomedical Materials

Após avaliações, realizadas por diferentes métodos, observaram maior quantidade de neoformação óssea – tecido novo – nos grupos que receberam os enxertos autólogos e autógenos e também naqueles que receberam os mesmos enxertos acrescidos da proteína do látex.

Contudo, chamou a atenção dos cientistas o aumento da MMP-9 (metaloproteinase de Matriz 9, enzima relacionada ao processo de reparo celular) nos tecidos tratados com o látex, principalmente nos exames realizados na primeira fase das análises, ocorrida na quarta semana pós-implante.

Segundo João Paulo Mardegan Issa, professor da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (Forp) da USP e um dos responsáveis pelo estudo, esses dados confirmam o que outras pesquisas já haviam encontrado sobre essa enzima. Durante uma resposta inflamatória, “a MMP-9 está ativa no tecido lesado e este evento se relaciona com a reparação das áreas de cicatrizes no osso, otimizado com o uso da F1”.

Apesar da F1 apresentar propriedades importantes para o reparo de tecidos do organismo animal – como a de formação de novos vasos sanguíneos, a adesão celular e da matriz extracelular, novos experimentos devem ser realizados até que o látex da seringueira possa ser utilizado no reparo ósseo de humanos. O professor comenta que ainda precisam “esclarecer os efeitos desta proteína nessa restauração do osso, especialmente envolvendo o uso de outros modelos animais experimentais e períodos de tempos de recuperação”.

Futuro promissor para um produto nacional

Os especialistas asseguram que biomateriais com as características da F1 são importantes para correção de defeitos que eles chamam de críticos, pois se trata de feridas intraósseas e de grandes proporções para uma cura espontânea.

Informações como as recém-publicadas pela equipe da USP e da Unesp devem colaborar para um futuro promissor do uso do látex em recuperação de ossos. Além do alto potencial de reparação óssea e da biocompatibilidade, o látex é um “material nacional e de baixo custo quando comparado a outros produtos de estímulo reparativo disponíveis no mercado”, lembra o professor.

Os estudos sobre o uso clínico do látex começaram na década de 1990, com uma equipe liderada pelo professor Joaquim Coutinho Netto, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP. Com o látex produzido pela árvore da borracha, a Hevea brasiliensis, os pesquisadores desenvolveram uma biomembrana de látex natural especial para o tratamento de lesões em tecidos moles. Os resultados dessas pesquisas provaram a segurança e eficiência do látex no reparo de diferentes tecidos. O professor Coutinho faleceu em setembro de 2012.

A pesquisa agora publicada integra a tese de doutorado da dentista Bruna Gabriela Santos Kotake, apresentada à FMRP em 2016. Bruna trabalhou sob orientação do professor da Forp João Paulo Mardegan Issa.

Mais informações: e- mail jpmissa@forp.usp.br ou brunakotake@gmail.com

Frutas brasileiras são ricas em antioxidantes e anti-inflamatórios

24/04/2018 

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Consumidas regulamente como alimentos funcionais, frutas poderiam ajudar na prevenção de doenças como câncer e ataque cardíaco

Estudo avaliou o potencial antioxidante, anti-inflamatório e a composição fenólica de dez frutas nativas brasileiras ainda pouco conhecidas pela ciência, como cajá, cambuci e murici vermelho (na imagem) – Foto: Divulgação / Esalq

As frutas nativas brasileiras são fontes de substâncias antioxidantes e anti-inflamatórias, bem como de uma grande diversidade de compostos fenólicos, os quais podem propiciar importantes benefícios para a saúde humana. Essa é a conclusão de um estudo desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba. Em parceria com a Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP) da Universidade de Campinas (Unicamp), a pesquisa da engenheira de alimentos Jackeline Cintra Soares avaliou o potencial antioxidante, anti-inflamatório e a composição fenólica de dez frutas nativas brasileiras ainda pouco conhecidas pela ciência, como o cajá e o cambuci.

“O Brasil possui condições climáticas adequadas para o desenvolvimento de um grande número de frutas nativas”, aponta Jackeline Soares. “Essa biodiversidade tem se tornado um caminho promissor para a descoberta de novos compostos bioativos capazes de ser utilizados na formulação de alimentos funcionais e medicamentos”, completa. O estudo tem orientação do professor Severino Matias de Alencar, do Departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição da Esalq.

Segundo a pesquisadora, os compostos fenólicos apresentam ações específicas, podendo atuar como antioxidantes e anti-inflamatórios, assim prevenindo doenças crônicas não transmissíveis, como as cardiovasculares e a diabete, por exemplo. “Nosso objetivo foi avaliar a capacidade desativadora de espécies reativas de oxigênio e nitrogênio, atividade anti-inflamatória in vitro e in vivo e a composição fenólica. A técnica utilizada foi a espectrometria de massas de alta resolução, realizada em dez frutas nativas brasileiras.”

Assim, foram mapeados o araçá-boi (Eugenia stipitata), o cambuití-cipó (Sagerectia elegans), o murici vermelho (Byrsonima arthropoda), o murici guassú (Byrsonima lancifolia), o morango silvestre (Rubus rosaefolius), o cambuci (Campomanesia phaea), o jaracatiá-mamão (Jacaratia spinosa), o juquirioba (Solanum alterno-pinatum), o fruta-do-sabiá (Acnistus arborescens) e o cajá (Spondias mombin L.). As amostras foram coletadas no Sítio Frutas Raras, localizado na cidade de Campina do Monte Alegre (SP), exceto o cajá, que foi coletado na Fazenda Gameleira, município de Montes Claros de Goiás (GO).
Diversidade de compostos fenólicos presentes nas frutas pode propiciar importantes benefícios para a saúde humana. Na imagem, o cajá – Foto: Divulgação / Esalq

Antioxidantes

Foram identificados compostos fenólicos pertencentes à classe dos flavonoides (catequina, epicatequina, rutina, quercetina glicosilada, kaempeferol glicosilado, quercetina, procianidina B1 e procianidina B2), subclasse do ácido hidroxibenzoico (ácido gálico) e subclasse dos ácidos hidroxicinâmicos (ácido cumárico, ácido ferúlico e cafeico). Das frutas analisadas, o araçá-boi, cambuití-cipó, murici vermelho, morango silvestre e cajá foram as que apresentaram as maiores atividades antioxidantes e/ou anti-inflamatórias, cujo perfil fenólico indicou a presença de 18 compostos no araçá-boi, 32 no cambuití- cipó, 26 no murici vermelho e 20 e 11 compostos no morango silvestre e cajá, respectivamente.

Nas frutas cambuití-cipó, murici vermelho e morango silvestre também foi possível a identificação e quantificação de antocianinas, sendo que no cambuití-cipó foi identificada a kuromanina e a mirtilina. Já para o murici vermelho e o morango silvestre, somente a kuromanina foi encontrada. “Esta é a primeira vez que se relata a presença destas antocianinas no cambuití-cipó e murici vermelho. Portanto, as frutas nativas estudadas apresentam compostos bioativos com atividades antioxidante e anti-inflamatória e, quando consumidas regulamente como alimentos funcionais, poderiam ajudar na prevenção de doenças crônicas não transmissíveis.”
Morango silvestre – Foto: Divulgação / Esalq

Um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) publicado em 2017 recomenda um mínimo de 400 gramas de frutas e vegetais por dia (excluindo batatas e outros tubérculos) para a prevenção de doenças crônicas, como doenças cardíacas, câncer, diabete e obesidade, especialmente em países menos desenvolvidos.

Ainda segundo Jackeline Soares, “existe a necessidade de se buscar novos alimentos que, além de nutrir, apresentem atividades biológicas que possam inibir ou amenizar danos oxidativos relacionados a processos inflamatórios, limitando assim a progressão de certas doenças de origem metabólica e degenerativas prevalentes, principalmente quando se considera que estamos em um país detentor de uma das maiores biodiversidades do Planeta”.

Caio Albuquerque / Divisão de Comunicação da Esalq

Mais informações: e-mail jackelinecintrasoares@gmail.com, com Jackeline Cintra Soares

Quatis se automedicam e transmitem o comportamento entre gerações

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25/04/2018 

Estudo em ilha catarinense identifica animais que “espumam-se” com produtos de limpeza humanos

Produtos de limpeza humanos são usados em áreas úmidas e quentes do corpo, onde normalmente se desenvolvem bactérias e fungos – Foto: Halley Pacheco de Oliveira via Wikimedia Commons / CC BY-SA 3.0

É natural ver os quatis sul-americanos esfregar seus corpos com artrópodes, como o piolho-de-cobra, e secreções de plantas. O hábito, acreditam os biólogos, os ajuda a repelir mosquitos e carrapatos. Mas um grupo desses animais, que vive no sul do Brasil, vem se familiarizando com produtos de higiene humana para “automedicação”. É o que aponta estudo da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP e da Universidad del Rosario da Colômbia.

Moradores da Ilha Campeche na cidade de Florianópolis, Santa Catarina (SC), esses quatis esfregam sabonetes, sabão em pó e até desengordurante líquido no corpo. “Esses produtos costumam ser deixados por turistas, visitantes e moradores da ilha, que é um local turístico”, explica Aline Gasco, doutora em Ciências pela FFCLRP e uma das autoras do estudo.

O ato de esfregar (chamado de unção) é realizado entre o grupo em sessões que duram de alguns segundos até cinco minutos. Normalmente, usam as patas, boca, nariz e dentes para aplicar o produto na região genital e na cauda, “nessas áreas, úmidas e quentes do corpo, onde normalmente se desenvolvem bactérias e fungos”, afirma.

Para o professor Andrés M. Pérez-Acosta, da Universidad del Rosario, o comportamento pode ser uma nova variação da cultura da automedicação e “uma novidade dentre os carnívoros para aliviar irritação e coceira causadas por ectoparasitas”.
O ato de esfregar (chamado de unção) é realizado entre o grupo em sessões que duram de alguns segundos até cinco minutos – Foto: Quartl via Wikimedia Commons / CC BY-SA 3.0

Além disso, o estudo aponta que esse comportamento de automedicação existe há mais de uma década e se transformou numa aprendizagem social transmitida entre gerações. “A plasticidade comportamental e motivação em explorar novas situações é característica dos quatis”, diz Aline.

O quati (mamífero carnívoro) não é nativo da Ilha de Campeche. Segundo relatórios não oficiais, um casal adulto da espécie foi capturado na cidade de Palhoça (SC) em 1950 para ser introduzido na ilha. “Embora exótica, essa população de quatis oferece uma oportunidade rara de se estudar a cultura da automedicação em animais”, comenta a orientadora da pesquisa, professora Patrícia Ferreira Monticelli. Antes de ser vistos como problema, diz a professora que é preciso melhorar a gestão dos resíduos orgânicos na ilha e o hábito dos turistas de alimentar os animais.

Os pesquisadores propõem o monitoramento desses animais para avaliar “os níveis de infestação ectoparasitária na tentativa de relacioná-la ao uso dos produtos de higiene humanos”. Este trabalho, segundo eles, requer uma abordagem multidisciplinar para entender completamente o “comportamento de automedicação com produtos de limpeza humanos”.

O estudo Ring-tailed coatis anointing with soap: a new variation of self-medication culture? foi publicado no International Journal of Comparative Psychology. Pérez-Acosta foi professor visitante da USP em 2015, quando trabalhou com Aline e Patrícia.

Mais informações: e-mail pmonticelli@ffclrp.usp.br, com Patrícia Monticelli

domingo, 22 de abril de 2018

Dez fatos sobre o feijão-borboleta

Texto:

Giovanna Brito Lins - Graduanda em Ciência e Tecnologia e Ciências Biológicas na Universidade Federal do ABC 
Marcos Roberto Furlan - Engenheiro Agrônomo - Professor - Faculdade Cantareira/Unitau 
Virgínia Vieira Santos Silva - Graduanda em Engenharia Agronômica - Faculdade Cantareira

De lindas flores azuis, a Clitoria ternatea L. é cultivada como forrageira, ornamental, medicinal e comestível, sendo mais conhecida pelo nome de feijão-borboleta.

É uma trepadeira perene. Floresce em quase todos os meses do ano no Brasil e desenvolve-se muito bem em pleno sol. Necessita de outra planta ou estrutura onde possa se apoiar e, com este suporte pode atingir até 4 m de altura. 

É considerada uma “planta de companhia”, auxiliando no crescimento e no desenvolvimento de outras plantas de maior interesse de cultivo, característica esta que lhe confere, ainda, o uso em áreas de recuperação ambiental, por exemplo. 
10 usos e curiosidades sobre o feijão-borboleta 

1. Originária de regiões da Ásia Tropical. É também conhecida como ervilha-borboleta, butterfly pea, campanilla, rainha-azul, ismênia, cunhã, clitória ou palheteira; 

2. É encontrada em diversas regiões da América do Sul, África e Austrália. 

3. Pertence à Família Fabaceae, a mesma do feijão, ervilha, soja, dentre outras 

4. Por não ser de consumo habitual entre a população como alimento, é considerada uma PANC (Planta Alimentícia não Convencional). Suas flores, folhas e vagens são comestíveis. Podem ser consumidas em saladas, geleias, gelatinas, sucos, chás, sopas, sorvetes, patês, arroz, tapioca. 

5. Também na alimentação, o feijão-borboleta é utilizado como um corante natural, dando o tom azul intenso, resistente ao cozimento.

5. Suas infusões possuem antocianina, que lhe conferem a coloração azul e podem ser utilizadas como indicadores de pH, uma vez que em contato com substâncias ácidas, a cor passa a ser rosada.

6. A planta está, culturalmente, associada à figura feminina: “Cunhã”, em tupi, quer dizer “mulher”. “Ismênia” é uma variação de “Ismeno”, que é o nome de um rio situado na região da Beócia, na parte central da Grécia, o qual, acordo com a mitologia, era onde se banhavam as ninfas Ismênides, que representavam as forças vivas da natureza, além de ser nome da filha de Édipo, outro personagem mitológico. O nome do gênero (Clitoria) faz referência à semelhança morfológica com o clitóris. 

7. Se adapta bem em diversos de ambientes e tipos de solos

8. É uma planta fixadora de nitrogênio no solo.

9. Em usos medicinais, pode ser utilizada em tratamento de infecções de garganta e olho, febre, indigestão, estresse e fortalecimento da memória. 

10. Feijão-borboleta é rico em fitoquímicos/fitonutrientes. A infusão das flores é hepatoprotetora e antidiabética. O suco é usado para curar picadas de insetos e doenças de pele. 

Referências 

DURANTE, Stéphanie. Conheça as PANC - plantas alimentícias não convencionais. 1. Disponível em: <https://revistacasaejardim.globo.com/Casa-e-Jardim/Paisagismo/noticia/2017/08/o-futuro-pertence-panc.html>. Acesso em: 15 abr. 2018. 

Fact sheet: Clitoria ternatea. Disponível em: < http://www.tropicalforages.info/key/forages/Media/Html/entities/clitoria_ternatea.htm> Acesso em: 19 abr. 2018 

FIGUEIREDO, N. Clitória: a flor corante e suas curiosidades!. Disponível em: <http://nofigueiredo.com.br/clitoria-a-flor-corante-e-suas-curiosidades/> Acesso em 19 abr. 2018 

FITOQUÍMICOS: O que é fitoquímico?. Disponível em: <https://www.copacabanarunners.net/fitoquimicos.html>. Acesso em: 15 abr. 2018. 

G. MARCELINO, Dianes. Feijão-borboleta ou Cunhã, curiosidades e propriedades medicinais. . 1. Disponível em: <http://www.naturezaeconservacao.eco.br/2017/11/feijao-borboleta-ou-cunha-curiosidades.html>. Acesso em: 15 abr. 2018. 

REIS RANIERI, Guilherme. Guia Prático de PANC (Plantas Alimentícias não Convencionais) . 1. ed. São Paulo: Instituto Kairós, 2017. 44 p. v. 5. 

SISTSP [Banco de Plantas Notáveis] Projeto Tudo Sobre Plantas - Brasil. 1. Disponível em: <https://www.tudosobreplantas.com.br/asp/plantas/ficha.asp?id_planta=22831>. Acesso em: 15 abr. 2018.