“Seus frutos são ingeridos tanto in natura como em
preparados, como remédio contra a tosse, com ação expectorante nas infecções
respiratórias, recomendados para o tratamento de asma e de bronquite. Os mesmos
frutos são considerados antihelmínticos, sendo que seu sumo tem ainda efeito
sobre tecidos decompostos, deixando feridas completamente limpas”. A descrição
do potencial da Bromelia antiacantha, publicada pelo padre pesquisador
Raulino Reitz no fascículo da Flora Ilustrada Catarinense “Bromeliáceas e a
malária – bromélia endêmica” permanece como estímulo a novos estudos.
O pensamento do padre botânico de que “Todas as plantas são
potencialmente úteis” está presente na tese ´Uso e manejo de Caraguatá (Bromelia
antiacantha) no Planalto Norte Catarinense: está em curso um processo de
domesticação?`, em desenvolvimento junto ao Programa
de Pós-Graduação em Recursos Genéticos Vegetais da UFSC.
O trabalho da bióloga Samantha Filippon com a bromélia nativa da Mata Atlântica
é uma continuidade dos estudos iniciados em seu mestrado, orientado no mesmo
programa pelo professor Maurício Sedrez dos Reis (e agora com coorientação do
professor Nivaldo Peroni). “Esperamos que com o aprofundamento dos estudos
etnobotânicos se possa resgatar e caracterizar junto à comunidade local as
formas de manejo da espécie”, explica Samantha.
Conservabio
A pesquisa é realizada em áreas da Floresta Nacional de Três Barras,
administrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio), órgão ambiental do governo brasileiro. A floresta é localizada no
planalto norte de Santa Catarina, entre os municípios de Três Barras e
Canoinhas. O trabalho envolve a comunidade de Campininha, que participa do
projeto “Rede para geração do conhecimento na conservação e utilização
sustentável dos recursos florestais não madeiráveis da Floresta Ombrófila
Mista”, sigla Conservabio. A iniciativa é financiada e coordenada pela Embrapa.
Os estudos de Samantha são executados em uma área de
floresta secundária, utilizada como mangueirão para animais cerca de 60 anos
atrás, e onde atualmente existe uma grande densidade da Bromelia
antiacantha. Se estendem também a uma área caracterizada como mata nativa, em
que há décadas foi realizada exploração madeireira, e a algumas propriedades
rurais na comunidade.
A meta é esclarecer aspectos sobre o manejo do caraguatá nas
paisagens com maior interferência humana, principalmente na confecção das
cercas vivas. O projeto vai buscar informações sobre a seleção das plantas, de
onde vêm as mudas, quem faz as cercas e porque – pois ainda que não sejam mais
utilizados os antigos mangueirões, ainda são feitas cercas com a bromélia.
Estas estruturas de gravatá são utilizadas há décadas, o que foi comprovado por
Samantha ao visitar as propriedades e em relatos de agricultores de que algumas
existem há cerca de 70 anos.
Domesticação
Em sua dissertação,
a bióloga já havia observado que vários agricultores praticaram ou praticam
algum tipo de manejo sobre o caraguatá. “Pelo fato de existir manejo e seleção
de plantas, principalmente para as cercas vivas, seja por vigor, facilidade de
manuseio ou crescimento rápido, pode estar em curso um processo de domesticação
dessa espécie pela comunidade local”, considera Samantha, que tem como desafio
em sua tese elucidar aspectos culturais envolvidos no uso e manejo da bromélia.
Sua investigação associa estudos demográficos (para documentação de
padrões de propagação, brotação, frutificação e crescimento, entre outros) a
pesquisas genéticas e etnobotânicas.
“Essa espécie mostra potencial econômico e seu uso pode ser
estimulado com a utilização em programas de diversificação ou de incremento de
renda para comunidades rurais e semi-urbanas”, considera a bióloga. “Mas são
necessários mais estudos para avaliar o impacto da extração sobre a diversidade
genética e a regeneração natural, assim como sobre sua disponibilidade para a
fauna, o que pode auxiliar o estabelecimento de estratégias sustentáveis de
manejo”, complementa.
Segundo ela, ainda que a Bromelia antiacantha reúna
características medicinais, alimentícias, ornamentais e industriais, é uma
espécie pouco estudada quanto a seu uso. Em pesquisa na literatura, Samantha
não encontrou estudos sobre a domesticação do caraguatá, apesar da expressiva
utilização em comunidades rurais do Planalto Norte Catarinense e também no Rio
Grande do Sul.
Ecologia da espécie
Outros pesquisadores já descreveram características medicinais, alimentícias,
ornamentais e industriais (para fabricação de fibras para tecidos, cordoaria e
de sabão) do caraguatá. Sua utilização na medicina popular é descrita desde a
década de 1940.
No trabalho de mestrado desenvolvido entre o final de 2007 e
o início de 2009, Samantha observou que na comunidade de Campininha, em Três
Barras (SC), o caraguatá tem três usos principais: xarope expectorante (feito
com frutos maduros), palmito (retirado da base das folhas da bromélia) e em
cercas vivas. A pesquisa também possibilitou um maior conhecimento sobre a
ecologia da planta, sua reprodução, período de floração e predadores.
Segundo Samantha, um levantamento preliminar indica o início
da construção de um mercado para o caraguatá. Há comercialização em bancas
medicinais em mercados públicos, feiras e eventos relacionados à biodiversidade
ou a plantas medicinais. A comercialização acontece tanto em cacho como em
pacotinhos contendo cerca de 100g. Há também comercialização de mudas,
licores e geleias. A defesa da tese está prevista para o inicio de 2013.
Mais informações: samabiol@gmail.com / Fone: 48
3721-5322
Por Arley Reis / Jornalista da Agecom
Foto: caraguatá
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