Por Rúvila Magalhães - ruvila.avelino@usp.br
Publicado em 18/março/2013
A análise de artigos científicos na área da educação publicados entre 2000 e 2010 reforça a ideia de que não se pode falar em conceitos absolutos sobre o tema. Não há lugar para verdades definitivas sobre a infância, mas para uma grande diversidade de saberes e pontos de vista. A conclusão é de uma pesquisa realizada pela pedagoga Lilian Alboz, na Faculdade de Educação (FE) da USP. Investigações sobre o poder exercido sobre as crianças e sobre a infância, no geral, também foram detectadas nas publicações estudadas.
Sob a orientação da professora Maria Letícia Barros Pedroso Nascimento, Lilian embarcou em sua pesquisa devido ao seu interesse no trabalho com crianças e a sua experiência profissional com educação infantil e ensino fundamental I, que abarca crianças de várias faixas etárias. Dentre as diferentes possibilidades de investigação que sua experiência profissional lhe possibilitaria, Lillian optou por buscar e estudar a produção acadêmica e científica sobre a educação. “Tal empreitada ajudaria a melhor compreender as teorias pós-críticas, seus propósitos e contribuições para se pensar a infância e sua educação”, afirma Lilian.
A teoria pós-crítica do currículo escolar, dentre seus vários objetos de estudo e vertentes, estuda também a multiculturalidade em suas origens, buscando garantir um aproveitamento educacional igualitário independentemente das diferenças culturais. Essa teoria lança questionamentos sobre a desvalorização da cultura de alguns grupos étnicos em detrimento de outros, assim como questiona alguns conceitos da modernidade como a razão e a ciência. A pós-crítica é baseada também no pós-estruturalismo que acredita que o conhecimento é algo incerto e indeterminado.
Foram escolhidos artigos de periódicos científicos na área da educação publicados no período de 2000 a 2010.
O objetivo do estudo foi entender de que forma se dava a produção acadêmica da educação pós-crítica sobre a infância, especialmente os trabalhos inspirados na obra do filósofo francês Michel Foucault, durante o período analisado. Para atender aos objetivos do trabalho foram escolhidos artigos de periódicos com referencial bibliográfico foucaultiano, observando se as temáticas envolviam crianças ou a infância e se nos resumos havia referências a conceitos desenvolvidos por Foucault. O filósofo é conhecido por, entre outros feitos, estudar as relações entre poder e conhecimento. Para ele, o conhecimento tem sempre uma finalidade, que é a vontade de dominar, logo, buscar a verdade seria uma forma de atingir o poder. Não há poder sem o saber e ambos residem nas relações sociais, segundo sua teoria.
Como o tema ”educação na infância” é marcado pela diversidade de opiniões, sempre havendo discordâncias em relação à caracterização ou homogeneização da teoria da pós-crítica, buscou-se montar esse apanhado de pontos em comum escolhidos a partir da leitura de estudiosos do assunto. Foi possível identificar que tais produções colocam em xeque as relações poder/saber envolvendo a infância. A fidelidade dos questionamentos pós-críticos dessas obras também são estudados. No entanto, o objetivo final da pesquisa não é estabelecer conceitos, mas apresentar um olhar analítico sobre as produções estudadas.
Resultados
Por meio da análise dos artigos selecionados, foi possível perceber que os autores dos artigos estudados buscam entender como o poder se exerce sobre a infância, cada um a sua maneira, com um diferente objeto de análise. A partir de uma análise geral, pode-se concluir que a prática do poder ocorre por meio de uma rede de poderes, saberes, aparatos e tecnologias, todos eles em permanente deslocamento devido à resistências encontradas no caminho. Ao mudar uma forma de poder ou saber, a influência das linhas de força acaba por modificar-se, gerando linhas de fuga e consequentemente produzindo novos modos de visibilidade e interpretação no que diz respeito à infância.
Um exemplo pode ser encontrado no ambiente da sala de aula. O professor tem o saber que o aluno não tem, consequentemente ele é o portador do poder nesse ambiente, validado pela instituição escolar e as tradições que ela carrega. Quando o professor encontra a necessidade de mudar a estratégia de aula diante do choro de um aluno ou de uma situação de conflito, esse aluno exerce o poder sobre o professor. A mesma situação pode ocorrer por meio do carinho ou pela persuasão.
“Fica evidente, na análise dos textos, que a escola, a pedagogia, as políticas educacionais funcionaram e continuam operando como potentes máquinas na fabricação da infância”, conclui Lilian. Por fim, a dissertação Sobre infância e poder: o que diz a produção acadêmica de periódicos científicos da educação de 2000 a 2010? constitui uma referência teórica para pesquisadores interessados no tema.
Imagem: Marcos Santos / USP Imagens
Mais informações: email liliorpe@terra.com.br, com a pesquisadora Lilian Alboz
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