quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Parte 1 - Preservar é bom, mas desenvolver com ecoeficiência é melhor, para os amazônidas! artigo de João de Deus Barbosa Nascimento Júnior

[EcoDebate] A Amazônia é uma das regiões do mundo aonde será decidido o futuro ambiental do planeta, com a maior biodiversidade e a que mais produz serviços ecossistêmicos, como: regulação do clima, manutenção das funções hídricas e cultural (Cardoso et al., 2005; Boerner et al., 2007). Considerando-se o estabelecimento do objetivo de limitar a 2°C (dois graus centígrados) o aumento da temperatura, isso só será possível, se houver a interrupção completa do desflorestamento (Richardson et al., 2009). Além disso, existe o perigo que como consequência do desmatamento, chegue-se a um limite irreversível, além do qual a floresta não mais poderá ser mantida (Mahli et al., 2009).

A necessidade de conservação na Amazônia gera grandes pressões em nível nacional e internacional sobre os gestores para manter a floresta intacta (Peres, 2005; Nepstad et al, 2006; 2008; Phillips et al. 2009; Lawrence et al., 2007). Ao mesmo tempo, os amazônidas ou povos da floresta, tem uma grande necessidade de desenvolvimento socioeconômico, onde essas populações, que colonizaram as áreas desmatadas estão muito empobrecidas e a oferta de serviços públicos, como assistência técnica, para melhorar a produção sem degradação do ambiente, é deficitária (Grieg-Gran et al., 2005, Maertens et al., 2006; BNDES, 2010).

O acesso à saúde, a educação, à assistência técnica e o transporte fluvial precisam ser aperfeiçoados. Enquanto que muitas das ações são dedicadas à conservação da floresta, por outro lado, observa-se, pouco interesse em melhorar as condições econômicas, sociais e ambientais da produção, com ecoeficiência (Edwards et al., 2010). As áreas desmatadas, já degradadas, não estão sendo consideradas para um melhoramento nos três elementos da ecoeficiência: melhorar a eficácia e eficiência da produção (renda por hectare usado e por pessoa trabalhando), favorecer o desenvolvimento social e conservar a biodiversidade na propriedade e as qualidades físico-químicas do solo as quais determinam os serviços ambientais produzidos pelos solos (BNDES, 2010).

Reconstruir paisagens degradadas usando modelos ecoeficientes em áreas colonizadas na Amazônia, objetivando atingir as metas de um desenvolvimento humano adequado e também aumentar as funções ecológicas do ecossistema é necessário para reverter à relação, muitas vezes observada entre o desenvolvimento e a qualidade do meio ambiente. Ao se desenvolver processos, otimizando o uso da terra já alterada ou antropizada, a pressão sobre a floresta diminuiria, bem como a necessidade de desmatamento para incorporação de novas terras para cultivo.

Para tal os sistemas econômicos e instituições devem estar organizados de modo a manter a eficiência tanto dos processos ecológicos quanto produtivos. A premissa central é que o uso ecoeficiente dos recursos naturais da Amazônia passa por um redesenho das paisagens. Atualmente a Amazônia apresenta áreas degradadas que podem regenerar-se e voltarem a ser integradas ao processo produtivo ou ainda incorporadas na paisagem agrícola como áreas de conservação ambiental. Além disso, para enfrentar o clima prognosticado para o ano de 2030 é necessário que haja, desde já, uma preocupação em ofertar a sociedade paisagens resilientes. As características que podem conferir a resiliência às paisagens dos sistemas produtivos ainda não são ainda bem conhecidas.

Fazer um diagnóstico preciso do estado atual ecológico e econômico das áreas afetadas, utilizando-se técnicas já existentes como o TERRACLASS e construir um modelo de simulação de cenários de remodelação de paisagens o mais ecoeficiente possível, dentro de cada contexto. Nestas paisagens, os esforços de restauração poderão ser pagos pela venda de commodities e serviços ambientais em mercados bem organizados. É fato que a mudança climática em andamento está provocando uma diminuição das chuvas e mais instabilidades no clima. A necessidade de frear o desflorestamento e proteger a produção de serviços ambientais vai originar políticas reforçadas, baseadas em subsídios para o desmatamento evitado (mecanismo REDD) e pagamento de serviços ambientais tais como: armazenamento de Carbono e proteção das áreas de captação de águas. Para melhorar a situação frente ao ataque à floresta e produzir mais commodities e serviços ambientais é fundamental estabelecer políticas públicas orientadas para incentivar a disseminação de sistemas produtivos sustentáveis. Portanto, urge a necessidade de se implantar um modelo de tratamento sistêmico envolvendo aspectos múltiplos da questão, integrando equipes multi e interdisciplinares em um consórcio interinstitucional de forma a potencializar as capacidades científicas, tecnológicas, gerenciais de extensão e difusão garantindo maior efetividade na geração e aplicação de políticas públicas.

O processo de modernização, que tinha como objetivo transformar a agricultura de insumos tradicionais em modernos não levou em consideração a capacidade e limites dos ecossistemas locais, principalmente o amazônico, a organização e os conhecimentos tradicionais da agricultura familiar (Costa, 2000). O resultado de todo estes processos ocasionaram alguns efeitos danosos ao ambiente que são refletidos nas unidades de produção e na vida de cada agricultor familiar.

Nessa região, a agricultura familiar pratica quase que exclusivamente, o sistema de agricultura itinerante, alternando períodos de cultivos com os de pousio, ocasião em que a vegetação secundária ou capoeira se desenvolve, para após algum tempo, ser transformada em fertilizantes para o próximo período de cultivo, adotando a técnica de derruba e queima que vem sendo questionada, pelas perdas de nutrientes, emissões de gases estufa e riscos de incêndio que a prática da queima representa.

Com isso, após vários anos em uso, este tipo de agricultura mantém níveis de sustentabilidade que decrescem na medida em que o tempo de pousio é reduzido. Em geral esse processo ocorre pelo aumento da pressão populacional, e redução ou desaparecimento das áreas de floresta secundárias, incluindo a renda e benefícios sociais e ambientais que essas oferecem, ao longo do tempo.

Associada a estes fatores, verifica-se atualmente nesta região, nos estabelecimentos de agrícolas, aumento de áreas de pastagens, na tentativa de praticarem pecuária bovina e de preparo de área com mecanização intensiva (aração e gradagem), para culturas semiperenes (maracujá e pimenta-do-reino) e para o plantio de feijão-caupi e melancia e intensificação agroquímica de culturas semiperenes, com mudanças importantes em escala de paisagem pela substituição da vegetação natural por meio dos sistemas de uso agrícola.

Os sistemas de uso da terra desenvolvidos pela pesquisa são: o plantio direto, integração lavoura-pecuária-floresta, sistema Bragantino, sistema Tipitamba e reflorestamento (incluindo os sistemas agroflorestais), descritos abaixo:

Plantio direto 

O Sistema Plantio Direto (SPD) na palha pressupõe que o cultivo das culturas ocorrerá em sucessão e/ou rotação de plantio, sem movimentação do solo e sobre palhada, seja da cultura anterior ou produzida apenas com a finalidade de cobertura. O SPD propicia ao agricultor um bom manejo da água e do solo, minimizando o processo erosivo e melhorando as condições de fertilidade. Um solo que apresente uma proteção superficial quer como cobertura vegetal viva ou morta, além de diminuir os riscos de perdas de solos, simultaneamente, propiciará uma reciclagem dos nutrientes do perfil. A manutenção de áreas produtivas e/ou recuperação de áreas degradadas, através da utilização do SPD tem como primeira atividade agrícola produtiva a implantação da cultura de arroz, que é a primeira utilizada dentro de sistemas de rotação e sucessão na recuperação de pastagem, em função de sua rusticidade e tolerância às condições menos favoráveis dos solos em processo de degradação. A cultura do arroz, dentro do processo, não proporciona ganhos econômicos substanciais, mas contribui com o sistema produtivo reduzindo o impacto do ônus de recuperação de áreas degradadas. A recuperação de áreas degradadas em sua segunda etapa (segunda safra), após a cultura do arroz, pode seguir vários caminhos, dependendo das condições de fertilidade do solo e perfil do produtor, mas de forma geral, ocorre o plantio da cultura do milho em consórcio com semeadura da planta de cobertura a Brachiaria ruziziensis, que é semeada no momento da adubação de cobertura da cultura do milho e, assim plantada, praticamente não afeta a produtividade da cultura do milho, pois germina atrasada em relação a esta e não se desenvolve de pronto. Por ocasião do amadurecimento do milho, em que suas folhas secam e após a colheita, as plantas de B. ruziziensis recebem insolação e se desenvolvem cobrindo o solo e produzindo boa massa em curto período, inclusive, se utilizada na integração lavoura-pecuária, é suficiente para sustentar acima de 2 UA/ha e rebrotar no início do inverno, quando propiciam boa cobertura do solo. A terceira etapa do processo preconiza o plantio de soja ou feijão, sobre a palhada, para atender o requisito de rotação de culturas e pela melhoria da fertilidade do solo. No final do ciclo da soja planta-se o milheto com intuito de formação de cobertura do solo para o próximo plantio que ocorrerá com a cultura de milho. Dependendo das condições de mercado, a soja pode ser plantada mais de uma vez no mesmo local. Diante do exposto, numa visão holística focada na sustentabilidade e responsabilidade sócio/econômica, em que a manutenção de áreas produtivas e recuperação de áreas degradadas são consequência do processo aplicado, que preserva o ambiente e a rentabilidade no âmbito agrícola, o SPD apresenta-se como o principal processo produtivo para as condições da Amazônia.

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