Agrotóxicos. Foto de Gervásio Lima
[EcoDebate] CASSAL et. al. (2014) concluem sua reflexão assegurando que no Brasil, os casos de intoxicação por agrotóxicos apresentam grande subnotificação e descentralização de informações, decorrentes de fatores diversos, como dificuldade de acesso dos agricultores às unidades de saúde, inexistência de centros de saúde em regiões produtoras importantes, dificuldade de diagnóstico e de relacionar os problemas de saúde com a exposição a agrotóxicos, escassez de laboratórios de monitoramento biológico e inexistência de biomarcadores precoces ou confiáveis.
Para CASSAL et. al. (2014), apesar das deficiências de registro, o Sistema Nacional de Informação Tóxico-Farmacológica (SINITOX) e o Sistema Nacional de Informação de Agravos Notificáveis (SINAN) são uma referência importante. Embora o maior consumo de agrotóxicos ocorra nos países desenvolvidos, grande parte de envenenamentos e mortes causados por agrotóxicos ocorre nos países em desenvolvimento, sendo preocupantes os quadros de contaminação humana e ambiental observados no Brasil.
Esta realidade pode estar associada à utilização desses produtos em excesso, à ocorrência de inadequados padrões ocupacionais e de segurança, ao desconhecimento dos riscos associados a sua utilização e consequente ineficiente uso de equipamentos de proteção individual, a elevados níveis de analfabetismo, à regulamentação e rotulagem insuficientes, a inadequadas ou inexistentes infraestruturas para lavagem dos utensílios, ao manuseio inadequado dos resíduos e das embalagens, ao aproveitamento dos recipientes para armazenar alimentos e água, bem como à grande pressão comercial por parte das empresas distribuidoras e produtoras.
Pode-se acrescentar também a existência de uma fiscalização precária do cumprimento das leis, uma deficiente assistência técnica ao homem do campo e a baixa atenção à saúde (CAMPANHOLA e BETTIOL, 2002; MOREIRA et al., 2002). Como já mencionado anteriormente, o Brasil é o oitavo maior consumidor de agrotóxicos por hectare do mundo, sendo os herbicidas (utilizados na destruição de plantam que impedem o desenvolvimento da cultura desejada) e inseticidas (produto próprio para matar insetos) responsáveis por 60% dos produtos comercializados no país.
LEVIGARD e ROZEMBERG (2004), em trabalho realizado em Nova Friburgo (RJ), a partir de entrevistas com profissionais da área da saúde, onde foram analisadas as formas de tratamento prestado às queixas de “nervos” dos agricultores. Se ressalta o fato dos profissionais na área da saúde estarem preocupados com os hábitos da população no consumo indiscriminado de calmantes, caracterizando a automedicação.
O uso de remédios sem prévia consulta com especialista, com o uso dos agrotóxicos utilizados nas lavouras, acaba por agravar o processo de intoxicação dos indivíduos. Investigações no estado do Rio Grande do Sul também apontam os malefícios da utilização de agrotóxicos para o meio ambiente e população humana.
FARIA et al. (2004), em estudo realizado com trabalhadores rurais cultivadores da fruticultura dos municípios de Antônio Prado e Ipê, constataram que das famílias entrevistadas, 95% informaram utilizar algum tipo de agrotóxico, 73% faziam uso regular de agrotóxicos na agricultura, e que, em média, 75% dos trabalhadores rurais relataram trabalhar regularmente com os agrotóxicos.
Estes autores constaram que a prevalência de exposição agroquímica foi maior entre os homens, estes em 86% dos casos, enquanto em 68% de casos com mulheres. Entre os agricultores, 35% disseram nunca terem usado luvas, máscaras ou roupas de proteção. Em um grupo considerado pelos autores sem escolaridade esse índice foi maior.
Também se percebeu que as intoxicações ocorreram, na maioria das vezes, entre outubro e janeiro, pois neste período devido às temperaturas elevadas, o organismo absorve mais as toxinas liberadas pelos agrotóxicos e também pelo fato das aplicações serem mais intensas nessa época do ano.
A gravidade destas intoxicações foi considerada leve-moderada em 80% dos casos e como grave em 20% das ocorrências (FARIA et al., 2004). Segundo o IBGE (2012), cerca de 70 milhões de brasileiros vivem em estado de insegurança alimentar e nutricional, sendo que 90% desta população, consome frutas, verduras e legumes abaixo da quantidade recomendada para uma alimentação saudável.
Segundo o dossiê ABRASCO (2012) a superação deste problema, seria por meio da conversão do modelo agroquímico tradicional e mercantil para um modelo de base agroecológica, baseado no controle social e na participação popular. No entanto, isso se trata de decisão política, de longo prazo, onde a educação continuada e a pesquisa também deverão ser fortalecidas nessa perspectiva.
Apesar da grande importância das atividades agrícolas, há pouco interesse no estudo de aspectos da saúde e segurança na agricultura. Existe grande interesse em desenvolver novas tecnologias para aumento da produção na agropecuária, sem levar em consideração os impactos à saúde e à segurança do trabalhador (FRANK et al., 2004).
Diante do exposto, no consumo de alimentos vegetais, o primeiro cuidado é saber a procedência dos produtos, optando sempre pelos que possuem origem identificada. Segundo a ANVISA (2011), a identificação aumentará o comprometimento dos produtores em relação à qualidade dos alimentos. Optar por orgânicos e sazonais também são procedimentos recomendados pela ANVISA para obter um produto livre de agrotóxicos. A lavagem correta dos alimentos e a retirada de cascas e folhas externas ajudam na redução dos resíduos de agrotóxicos presentes apenas nas superfícies.
CASSAL et. al. (2014) observam que no mundo todo, os efeitos dos impactos na saúde pública, bem como no meio ambiente vêm sendo percebidos. Em relação à saúde pública, o uso crescente desses compostos tem causado severos efeitos, sejam eles agudos ou crônicos, em vários trabalhadores, embora outros setores também sejam afetados.
O produtor rural é e será diretamente afetado. Ele tem que ser o primeiro a tomar providências, pois o seu ramo de atividade depende da adoção de práticas que conservem o meio ambiente e a sua própria saúde. É fato que para se produzir alimentos em larga escala, é indispensável o uso consciente dos agrotóxicos como uma ferramenta a mais para assegurar a proteção, contra baixas produtividades ou perdas de culturas.
Mas o controle químico só deve ser empregado após aplicação de todos os métodos de controles disponíveis, para se evitar problemas toxicológicos tanto para o homem quanto para o meio ambiente. Relatórios recentes de institutos de pesquisa demonstram que, caso nada seja feito, o clima será alterado em proporções drásticas, prejudicando especialmente aqueles setores da economia que dependem da natureza, como é o caso da agricultura.
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Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.
in EcoDebate, 26/02/2016
"Consequências de agrotóxicos na saúde pública, parte III (Final), artigo de Roberto Naime," in Portal EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/02/2016,http://www.ecodebate.com.br/2016/02/26/consequencias-de-agrotoxicos-na-saude-publica-parte-iii-final-artigo-de-roberto-naime/.
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