quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

Uso da Melissa officinalis no tratamento de cães

Franciele Beatriz Faria Santos. - acadêmica de Medicina Veterinária - Universidade de Taubaté

 Marcos Roberto Furlan - Universidade de Taubaté

A Melissa officinalis, conhecida popularmente como erva-cidreira ou melissa, tem despertado interesse na medicina veterinária devido às suas propriedades calmantes e antimicrobianas. Pesquisas recentes apontam para diferentes aplicações dessa planta em cães, abrangendo desde o manejo do estresse até o controle de infecções cutâneas e parasitas.

Efeito calmante e bem-estar animal
Roy et al. (2025) investigaram o impacto de um extrato hidroalcoólico de Melissa officinalis (MOE) e do ácido rosmarínico (AR) sobre o comportamento e o metaboloma de cães Beagle. O estudo, conduzido com 20 animais distribuídos em quatro grupos, demonstrou melhora significativa nos parâmetros comportamentais dos cães tratados com MOE (pontuação média 2,0) em comparação ao grupo placebo (-3,4). A análise metabolômica revelou alterações em vias relacionadas ao metabolismo lipídico e de ácidos biliares, sugerindo um mecanismo de ação associado à modulação do sistema GABA. Esses achados reforçam o potencial da Melissa officinalis como alternativa natural para reduzir estresse e ansiedade em cães.

Atividade antimicrobiana contra infecções cutâneas
Ebani et al. (2020) avaliaram a ação de óleos essenciais, incluindo o de Melissa officinalis, contra cepas de Staphylococcus spp. e Malassezia pachydermatis isoladas de cães com dermatite. Embora óleos como orégano e tomilho tenham apresentado maior eficácia antibacteriana, o óleo de Melissa demonstrou atividade antifúngica relevante, especialmente contra Malassezia, indicando seu potencial como coadjuvante no tratamento de otites e dermatites.

Complementando esses achados, Nocera et al. (2020) testaram a eficácia de óleos essenciais contra Staphylococcus pseudintermedius resistente e sensível à meticilina. O óleo de melissa apresentou atividade inibitória mínima (CIM) de 1:2048 v/v contra cepas sensíveis, sugerindo efeito limitado, mas ainda promissor como parte de terapias combinadas.

Controle de parasitas externos
Moog et al. (2020) exploraram o uso de um suplemento alimentar à base de plantas, incluindo Melissa officinalis, para controle de pulgas em cães. O produto Bioticks® demonstrou eficácia progressiva, atingindo 82% de redução na população de pulgas após cinco meses, sem efeitos adversos. Esse resultado indica que a melissa, associada a outras plantas, pode contribuir para estratégias naturais de controle parasitário.

Atividade antifúngica em otite externa
Bismarck et al. (2019) confirmaram a ação antifúngica do óleo essencial de Melissa contra isolados clínicos de Malassezia pachydermatis de orelhas caninas. A atividade volátil do óleo reforça sua aplicabilidade em terapias tópicas ou aromaterapia veterinária.

Considerações finais

Os estudos revisados demonstram que a Melissa officinalis apresenta diversas utilidades na medicina veterinária, sendo especialmente reconhecida pelo efeito tranquilizante, atividade antifúngica e auxílio no manejo de parasitas. Apesar de sua ação antimicrobiana contra bactérias ser menos potente em comparação a outros óleos essenciais, seu uso em terapias integrativas mostra-se promissor. São precisas investigações futuras para estabelecer doses padrão, vias de aplicação e garantir a segurança em uso prolongado.

Referências

Bismarck D, Dusold A, Heusinger A, Müller E. Antifungal in vitro Activity of Essential Oils against Clinical Isolates of Malassezia pachydermatis from Canine Ears: A Report from a Practice Laboratory. Complement Med Res. 2020;27(3):143-154. doi: 10.1159/000504316.

Ebani VV, Bertelloni F, Najar B, Nardoni S, Pistelli L, Mancianti F. Antimicrobial Activity of Essential Oils against Staphylococcus and Malassezia Strains Isolated from Canine Dermatitis. Microorganisms. 2020 Feb 13;8(2):252. doi: 10.3390/microorganisms8020252.

Moog F, Plichart GV, Blua JL, Cadiergues MC. Evaluation of a plant-based food supplement to control flea populations in dogs: A prospective double-blind randomized study. Int J Parasitol Drugs Drug Resist. 2020 Apr;12:35-38. doi: 10.1016/j.ijpddr.2020.02.001. Epub 2020 Feb 15. PMID: 32114287; PMCID: PMC7049570.

Nocera FP, Mancini S, Najar B, Bertelloni F, Pistelli L, De Filippis A, Fiorito F, De Martino L, Fratini F. Antimicrobial Activity of Some Essential Oils against Methicillin-Susceptible and Methicillin-Resistant Staphylococcus pseudintermedius-Associated Pyoderma in Dogs. Animals (Basel). 2020 Oct 1;10(10):1782. doi: 10.3390/ani10101782. PMID: 33019582; PMCID: PMC7601051.

Roy AS, Aberkane FZ, Cisse S, Guibert A, Richard D, Lerouzic M, Suor-Cherer S, Boisard S, Guilet D, Benarbia MEAB, Mallem MY. Metabolomics provides novel understanding of Melissa officinalis mechanism of action ensuring its calming effect on dogs. BMC Vet Res. 2025 Jul 11;21(1):459. doi: 10.1186/s12917-025-04904-8. 

quarta-feira, 12 de novembro de 2025

Nerium oleander L. utilizada na arborização urbana e casos de intoxicação em animais

Luana Salim Amancio Silva - acadêmica de Medicina Veterinária da Universidade de Taubaté
Maiara Vitoria de Campos - acadêmica de Medicina Veterinária da Universidade de Taubaté
Marcos Roberto Furlan - Universidade de Taubaté

Nerium oleander L., conhecida popularmente por espirradeira ou oleandro, é uma espécie ornamental amplamente utilizada na arborização urbana, mas representa risco significativo de intoxicação para animais domésticos e de produção. A presença de glicosídeos cardíacos, como a oleandrina, provoca sinais clínicos graves, incluindo depressão, anorexia, arritmias, atonia ruminal, dispneia e lesões hepáticas e cardíacas, podendo levar à morte.

Casos fatais em equinos, bovinos e pequenos animais são amplamente relatados, reforçando a necessidade de manejo adequado da planta em áreas rurais e urbanas (Butler; Khan; Scarzella, 2016; Abdou; Basha; Khalil, 2019).

Butler, Khan e Scarzella (2016) descreveram a intoxicação de dois cavalos miniatura que apresentaram letargia, anorexia e arritmias após ingestão provável de oleandro; um animal morreu e o outro foi eutanasiado, com diagnóstico confirmado pela detecção de oleandrina no conteúdo gastrointestinal e digoxina no soro. Em um caso inédito, Pao-Franco et al. (2017) relataram intoxicação grave em uma cadela da raça Rhodesian Ridgeback, refratária a terapias convencionais, mas tratada com sucesso por anticorpos Fab específicos para digoxina, embora com lesões isquêmicas de prognóstico incerto.

Rubini et al. (2019) documentaram a morte de seis bovinos após ingestão de oleandro misturado à forragem, confirmada por análise toxicológica. Ceci et al. (2020) relataram um surto em 50 vacas lactantes, com 13 mortes em quatro dias, apresentando sinais como depressão, anorexia, atonia ruminal, diarreia e arritmias; necropsias revelaram necrose cardíaca e enterite grave, e oleandrina foi detectada em tecidos e produtos lácteos, indicando risco para consumidores. Lisuzzo et al. (2025) descreveram o primeiro caso de intoxicação por inalação da fumaça da queima de oleandro, resultando na morte de 76 bovinos em 30 horas, com lesões hepáticas e cardíacas confirmadas.

Esses relatos evidenciam a alta toxicidade do oleandro e a necessidade de monitoramento rigoroso em áreas urbanas e rurais, bem como políticas preventivas para evitar envenenamentos acidentais e impactos na saúde animal e humana.

Referências

ABDOU, Rania H.; BASHA, Walaa A.; KHALIL, Waleed F.. Subacute toxicity of Nerium oleander ethanolic extract in mice. Toxicological Research, [S.L.], v. 35, n. 3, p. 233-239, 15 jul. 2019. http://dx.doi.org/10.5487/tr.2019.35.3.233.

BUTLER, Jarrod; KHAN, Safdar; SCARZELLA, Gina. Fatal Oleander Toxicosis in Two Miniature Horses. Journal of The American Animal Hospital Association, [S.L.], v. 52, n. 6, p. 398-402, 1 nov. 2016. http://dx.doi.org/10.5326/jaaha-ms-6433.

CECI, Luigi; GIROLAMI, Flavia; CAPUCCHIO, Maria Teresa; COLOMBINO, Elena; NEBBIA, Carlo; GOSETTI, Fabio; MARENGO, Emilio; IARUSSI, Fabrizio; CARELLI, Grazia. Outbreak of Oleander (Nerium oleander) Poisoning in Dairy Cattle: clinical and food safety implications. Toxins, [S.L.], v. 12, n. 8, p. 1-11, 24 jul. 2020. http://dx.doi.org/10.3390/toxins12080471.

LISUZZO, Anastasia; SPADOTTO, Luca; MURARO, Michele; MAZZARIOL, Sandro; CENTELLEGHE, Cinzia; SORANZO, Elena; RUBINI, Silva; LOCATELLI, Carlo A.; DACASTO, Mauro; TAIO, Giorgia. Case Report: oleandrin intoxication by inhalation in beef cattle. Frontiers in Veterinary Science, [S.L.], v. 12, p. 1-7, 8 set. 2025. http://dx.doi.org/10.3389/fvets.2025.1666317.

PAO‐FRANCO, Amaris; HAMMOND, Tara N.; WEATHERTON, Linda K.; DECLEMENTI, Camille; FORNEY, Scott D.. Successful use of digoxin‐specific immune Fab in the treatment of severe Nerium oleander toxicosis in a dog. Journal of Veterinary Emergency and Critical Care, [S.L.], v. 27, n. 5, p. 596-604, 29 jul. 2017. http://dx.doi.org/10.1111/vec.1263

RUBINI, Silva; ROSSI, Sabina Strano; MESTRIA, Serena; ODOARDI, Sara; CHENDI, Sara; POLI, Andrea; MERIALDI, Giuseppe; ANDREOLI, Giuseppina; FRISONI, Paolo; GAUDIO, Rosa Maria. A Probable Fatal Case of Oleander (Nerium oleander) Poisoning on a Cattle Farm: a new method of detection and quantification of the oleandrin toxin in rumen. Toxins, [S.L.], v. 11, n. 8, p. 1-9, 25 jul. 2019. http://dx.doi.org/10.3390/toxins11080442.