terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

Bactérias do bem

ter, 06 fev 2018

Linha de pesquisa da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) busca diversificar a utilização de probióticos nos alimentos

Texto -PATRICIA LAURETTI Fotos - ANTONINHO PERRI Edição de imagem - PAULO CAVALHERI
 
O professor Anderson Sant'Ana orienta pesquisas em busca de probióticos que resistam ao processamento de alimentos pela indústria

Cepas específicas de algumas bactérias podem ter efeitos benéficos à saúde. Lactobacilos e bifidobactérias já são utilizados em alguns alimentos como leite fermentado e iogurte, dentre outros. O consumo por períodos continuados é associado a possíveis melhoras na flora gastrointestinal. Estes microrganismos benéficos, conhecidos como probióticos, são definidos pela Organização Mundial de Saúde como “organismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem benefício à saúde do hospedeiro”.

O problema é a impossibilidade de colocar os probióticos em vários outros produtos alimentícios por limitações tecnológicas. Os probióticos são frágeis e, na maior parte das vezes, não suportam etapas de processamento dos alimentos ou mesmo sua adição em um meio ácido como o suco de laranja, por exemplo. É nessa linha que trabalha um grupo do Laboratório de Microbiologia Quantitativa de Alimentos, chefiado pelo professor Anderson Sant'Ana. Pesquisadoras orientadas pelo docente tiveram sucesso misturando outras formas de probióticos em suco, pão, macarrão ou requeijão. Para tanto desenvolveram pesquisas com os microrganismos inativados ou esporulados.

As irmãs gêmeas Caroline e Carine Nunes de Almada, e Mariana Batista Soares, já defenderam seus doutorados sobre o tema na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp. Os trabalhos das irmãs têm pedido de patente. Caroline trabalhou com paraprobióticos, que são as bactérias probióticas inativadas. Já Carine se dedicou ao estudo dos microrganismos probióticos esporulados, enquanto Mariana pesquisou, especialmente, como adicionar probióticos esporulados ao requeijão.

A fabricação de requeijão probiótico usando as cepas probióticas tradicionais de lactobacilos e bifidobactérias impõe muitas dificuldades a pesquisadores e indústria, pois o processo de fabricação deste produto envolve uso de altas temperaturas, o que levaria à morte dos probióticos tradicionais. “A adição dos probióticos após estes tratamentos térmicos não é factível do ponto de vista industrial pela possibilidade de recontaminação e dificuldades de homogeneização depois da fusão da massa”, explica o professor Anderson Sant’Ana.

Na pesquisa de Mariana os esporos de Bacillus probióticos se mostraram mais resistentes do que os probióticos de células vegetativas, quando colocados em contato com enzimas e pH diferentes do trato gastrointestinal. Da mesma forma, os probióticos esporulados resistiram aos diversos processos tecnológicos da indústria alimentícia simulados por Carine Almada, como pasteurização, cozimento, forneamento, irradiação ou fermentação.

Carine trabalhou com oito cepas de bacilos probióticos e alimentos variados, dentre eles, leite, suco de laranja, almondega, pão, pimenta em pó e iogurte. A cepa que mais se sobressaiu foi utilizada para a finalização da pesquisa na produção de pão, suco de laranja e iogurte probióticos, em que foram feitas análises in vitro, com simulações em laboratório, e in vivo, com roedores, para avaliação da resistência dos probióticos após a digestão.

Os animais que consumiram iogurte probiótico tiveram teores reduzidos de glicose em 10% e triglicerídeos em 34%. Além disso, houve uma alteração benéfica da microbiota intestinal. “O emprego de cepas probióticas de Bacillus significa que uma enorme gama de produtos alimentícios poderá agora ser desenvolvida”, estima Sant’Ana. A adição dos probióticos tradicionais não seria possível, pois eles não sobreviveriam ao processo ou a estocagem destes produtos.

“Apesar de seu potencial, atualmente só existe uma cepa probiótica de Bacillus com aprovação para aplicação em alimentos, o que significa que há grandes possibilidades para a descoberta de novas cepas com propriedades benéficas variadas. Este é um campo que pode evoluir muito rápido pela parceria Universidade-indústria”, acrescenta o docente da FEA.
  
Macarrão com um paraprobiótico ajudou a diminuir os níveis de colesterol e glicose em animais de laboratório

Paraprobióticos

A literatura científica já havia descrito que, mesmo mortos, os probióticos têm potencial para causar efeitos benéficos à saúde. Além do mais, como destaca Anderson Sant'Ana, o probiótico inativado, ou paraprobiótico, dura por mais tempo e pode ser adicionado a alimentos que passam por processos drásticos de alta temperatura e pressão. Outra vantagem é que pode ser administrado em pessoas imunossuprimidas.

Em sua tese de doutorado, Caroline Almada trabalhou com microrganismos vivos e inativados de lactobacilos e bifidobactérias. O primeiro passo do trabalho foi identificar os melhores processos para a inativação em três cepas, já que quanto mais integro o probiótico, maiores os benefícios à saúde. O resultado mais satisfatório foi a inativação por irradiação de uma bifidobactéria. Caroline adicionou o produto ao macarrão, que foi cozido e processado como uma farinha. A mistura administrada em roedores ajudou a diminuir os níveis de colesterol e glicose dos indivíduos.

“Pensando em alimentos funcionais e num cenário em que a gente vê cada vez mais associação entre a microbiota intestinal e a saúde dos consumidores, as pesquisas constituem uma estratégia de modular a microbiota intestinal para que as pessoas tenham os efeitos benéficos à saúde”, complementa Sant'Ana.
  
As gêmeas Caroline e Carine Nunes de Almada: processos desenvolvidos no doutorado já têm pedidos de patente.
 
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