terça-feira, 7 de outubro de 2014

Pesquisa investiga propriedades de planta do Cerrado para tratamento do vitiligo


Previsão é que em três ou quatro anos seja possível a transferência de tecnologia da universidade para o setor privado para a produção de medicamentos fitoterápicos

Texto: Serena Veloso | Foto: Carlos Siqueira e Adriana Cristina
"Fatores como desmatamento, queimadas e expansão da fronteira agrícola ameaçam o Cerrado, onde existem inúmeras espécies de plantas com potencial medicinal ainda não pesquisadas "

Pesquisadores da Faculdade de Farmácia (FF) da UFG estão desenvolvendo pesquisa científica com plantas originárias do Cerrado para produção de medicamentos para tratamento do vitiligo, doença não contagiosa que provoca a despigmentação da pele. O estudo se baseia na produção de extratos padronizados das furanocumarinas (psoraleno e bergapteno), substâncias encontradas na planta mama-cadela, cujo nome científico é Brosimum gaudichaudiI Trecul (Moraceae).

Coordenada pelo professor da Faculdade de Farmácia, Edemilson Cardoso da Conceição, a pesquisa é realizada em parceria com o professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP), Osvaldo Freitas. Também estão envolvidos um doutorando do Programa de Pós-Graduação em Inovação Farmacêutica, um mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas e alunos de iniciação científica dos cursos de Farmácia e Engenharia Florestal, todos da UFG.
Professor Edemilson Cardoso da Conceição e a mestranda Maria Cristina apresentando a matéria processada da planta mama-cadela

“A mama-cadela produz uma série de substâncias, entre elas, as chamadas furanocumarinas, que atuam nos melanócitos, células responsáveis pela produção do pigmento melanina, e estimulam a repigmentação da pele”, explicou o professor Edemilson Cardoso. Segundo ele, o objetivo da pesquisa é viabilizar formulações para produção de medicamentos fitoterápicos de forma sistemática e com fundamentação científica.
Em destaque, as diferenças de pigmentação em uma pele afetada pela doença

Tratamentos e inovações

A doença não possui tratamento definitivo, mas algumas alternativas são usadas para estimular a repigmentação da pele, como uso de corticoides, fotoquimioterapia, terapias orais ou tópicas com psoraleno, medicamentos imunomoduladores tópicos, laserterapia e, em alguns casos, terapias cirúrgicas, por meio de enxerto ou transplante de melanócitos, procedimento que transfere células produtoras do pigmento da pele de áreas com tecidos saudáveis para áreas despigmentadas.

De acordo com o coordenador da pesquisa, a mama-cadela tem sido utilizada pela população há anos para fins terapêuticos, mas de forma empírica e indiscriminada, o que pode causar certos danos à saúde, como a toxicidade no fígado. “Todo medicamento tem o fator toxicidade. Se há um aumento substancial da dosagem podem ser desencadeados efeitos tóxicos, mas se o medicamento for utilizado de forma sistemática, com orientação médica, são grandes as chances de sucesso”, observou.

A pesquisa teve a etapa de processamento finalizada – quando se desenvolve fórmulas farmacêuticas – e agora os pesquisadores estudam o desenvolvimento de formas para uso tópico e oral. A previsão é que em três ou quatro anos seja possível a transferência de tecnologia da universidade para o setor privado para a produção dos medicamentos fitoterápicos.

Por meio do Núcleo de Informação Tecnológica (NIT) da Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação (PRPI) da UFG, a universidade poderá negociar as fórmulas originais com empresas interessadas, reinvestindo os recursos arrecadados nas pesquisas desenvolvidas pela instituição. Os testes da eficácia das formulações em humanos ficará a cargo das próprias empresas, segundo regulamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Com causas ainda desconhecidas, o aparecimento da doença está relacionado a fatores como:

– autoimunidade; 
– desequilíbrios do sistema endócrino;
– alterações emocionais (estresse e ansiedade).

Preservação do Cerrado

A extração de matéria-prima do Cerrado de forma consciente, sem causar grandes impactos ambientais, é também uma das preocupações dos pesquisadores da Faculdade de Farmácia, que priorizaram no desenvolvimento do estudo a restauração do bioma, detentor de 5% da biodiversidade do planeta. Segundo dados do Ministério do Meio Ambiente, o Cerrado é um dos biomas mais ameaçados do Brasil. Fatores como desmatamento, queimadas e expansão da fronteira agrícola foram responsáveis pela degradação de quase metade da cobertura vegetal, causando a perda de espécies de plantas com substâncias ativas de grande potencial utilizadas na cura e no tratamento de diversas doenças.

Por isso, conjuntamente à etapa de processamento das substâncias pela Faculdade de Farmácia, estão sendo realizados estudos para viabilizar a reposição dos recursos extraídos do Cerrado, em parceria com o agrônomo João Carlos Mohn Nogueira, da Emater (Agência Goiana de Assistência Técnica, Extensão Rural e Pesquisa Agropecuária), e a Embrapa. “Temos que criar mecanismos e estratégias para explorar o Cerrado de forma racional, não destrutiva. Nossa abordagem tem esse diferencial, porque estamos pensando na parte agronômica”, afirmou o coordenador da pesquisa.

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