07 de fevereiro de 2017
Elton Alisson | Agência FAPESP – Uma molécula antioxidante chamada N-acetilcisteína (NAC), utilizada em saúde humana como xarope mucolítico para desobstruir as vias respiratórias, resultou no desenvolvimento de produtos que têm demonstrado ser eficientes para controlar pragas que atacam cítricos, como a clorose variegada dos citros (CVC) – conhecida popularmente como “amarelinho” –, o cancro cítrico e o greening (HLB).
Em testes em campo, plantas com CVC e sadias tratadas com os produtos à base de NAC apresentaram maior quantidade de frutos e diâmetro maior do que as que não receberam o mesmo tratamento, afirmou Simone Picchi, fundadora da CiaCamp – uma startup paulista que desenvolveu os produtos com apoio do programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP.
“Os primeiros ensaios em campo foram realizados pelo pesquisador Helvécio Della Coletta Filho, do Centro de Citricultura ‘Sylvio Moreira’, com plantas que estavam extremamente doentes com CVC, durante um período de seca em São Paulo, e os resultados foram muito positivos”, disse Picchi durante palestra no evento “Do básico ao aplicado: apoio da FAPESP na pesquisa em citricultura”, realizado em novembro, no auditório da Fundação.
“Estimamos que resultados semelhantes talvez possam ser obtidos em outros estados, como Sergipe, onde, ao contrário de São Paulo, a CVC ainda não é uma doença controlada”, comparou.
A pesquisadora teve a ideia de desenvolver os produtos após realizar um pós-doutorado na área de biofilme bacteriano em 2010 no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Genômica de Citros (INCT Citros) – um dos INCTs financiados pela FAPESP e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) no Estado de São Paulo –, sediado no Centro de Citricultura “Sylvio Moreira”, do Instituto Agronômico (IAC), em Cordeirópolis, no interior paulista, sob a supervisão da pesquisadora Alessandra Alves de Souza.
Na época, Souza estudava o NAC como uma possível alternativa para o controle do amarelinho.
Por meio do sequenciamento completo do genoma da bactéria Xylela fastidiosa, causadora da CVC, em 1999 – financiado pelo Programa Genoma –, os pesquisadores do Centro já tinham descoberto que, após infectar a planta, a Xylela forma um biofilme para que os microrganismos invasores possam aderir ao xilema, entupindo dessa forma esses vasos condutores de água e sais minerais da planta.
Com base nessa constatação, Souza decidiu testar se o NAC poderia romper esse biofilme no início de sua formação, combatendo a doença e desentupindo o xilema da planta para possibilitar o fluxo de água e sais minerais.
Os resultados foram bastante positivos e estimularam Picchi a testar o uso do NAC também no combate à bactéria Xanthomonas citri subsp. citri, causadora do cancro cítrico, durante seu pós-doutorado no Centro.
“Observamos que o NAC também atua na redução do cancro cítrico”, afirmou a pesquisadora.
A pesquisadora decidiu licenciar a patente da aplicação da molécula para o controle de pragas agrícolas do Centro e fundou a empresa.
Por meio do programa PIPE, da FAPESP, ela começou a realizar pesquisas para utilizar a molécula em produtos que pudessem ser usados como alternativas sustentáveis no manejo de doenças fitopatogênicas (bacterianas) que acometem a citricultura.
As pesquisas resultaram em dois produtos à base de NAC, sendo um para ser pulverizado e outro para ser aplicado como um fertilizante, na raiz das plantas.
“O NAC tem algumas vantagens: é uma molécula pequena, facilmente absorvida, que pode ser combinada a outras moléculas para potencializar sua ação, e não causa resistência das bactérias. Além disso, é de fácil degradação, não causando impactos ambientais”, afirmou.
Testes em campo
De acordo com Picchi, o produto pulverizável, denominado NAC Solution, foi aplicado nos testes em campo em plantas com cancro cítrico e HLB, com apoio do pesquisador Coletta Filho. Já o aplicado como fertilizante, batizado de NACagri, foi testado em plantas com CVC e cancro cítrico.
“As plantas com CVC tratadas com o fertilizante produziram 14 quilos a mais de frutos em comparação com as infectadas pela doença e que não receberam tratamento”, comparou Picchi.
Já as plantas com cancro cítrico e que receberam o produto pulverizado apresentaram uma regressão da doença comparável ao das tratadas só com cobre.
“Ainda não temos os resultados da aplicação do produto em uma safra completa, mas já observamos que a utilização dele por poucos meses apresenta um desempenho comparável ao do cobre, o que mostra que ele pode ser uma alternativa a esse produto que causa impactos ambientais”, afirmou Picchi.
Os pesquisadores estão realizando testes de controle do cancro cítrico em plantas sintomáticas e assintomáticas e de avaliação do NAC como agente antioxidante a estresse biótico – geralmente causado por seres vivos – e abiótico (como fatores ambientais) em plantas sadias.
“Como vimos que o produto também tem efeito em plantas sadias pode ser que contribua ainda para a redução de estresse e, com isso, ajude a planta a ter maior resistência”, estimou Picchi.
Segundo ela, os próximos passos serão continuar as pesquisas em campo durante duas safras completas para avaliar a dosagem e o número de aplicações ideal dos produtos para iniciar a sua comercialização em 2018.
Além disso, pretendem avaliar os efeitos do NAC em outras 10 bactérias fitopatogênicas causadoras de doenças em culturas como o café, a soja e o tomate.
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