terça-feira, 9 de julho de 2013

Solar e eólica desbancam nuclear e mudam setor alemão de energia


O esforço de US$ 710 bilhões da Alemanha para produzir energia limpa está reduzindo a geração dos reatores nucleares, as unidades em grande escala mais lucrativas do país, uma vez que os preços atingiram o menor patamar em seis anos. Matéria no Valor Econômico, socializada pelo ClippingMP.

A proporção das horas em que a energia elétrica foi negociada a menos de € 30 (US$ 39) o megawatt-hora, nível no qual, segundo o UBS, os reatores começam a perder dinheiro, subiu para 50% no ano mês passado, o maior índice desde 2007 e 92% maior que há um ano, segundo mostram dados da bolsa Epex Spot. A RWE reduziu a produção de sua usina de Gundremmingen, perto de Munique, 31 vezes no primeiro semestre, período em que houve um grande aumento na geração de energia solar e eólica, em comparação a 18 vezes em 2012, segundo dados compilados pela Bloomberg.

As reduções, que geralmente ocorrem por períodos de algumas horas a cada vez, mostram como o plano da premiê Angela Merkel de substituir a energia atômica por energias renováveis no prazo de uma década está ganhando força à custa dos lucros de empresas geradoras como a RWE e a EON. O boom da energia limpa, juntamente com a menor demanda em dez anos, derrubou a margem operacional de 15 companhias europeias tradicionais de energia, segundo dados da Bloomberg.

“Veremos mais situações parecidas, quando a produção renovável estiver muito alta, a ponto de os preços no mercado à vista entrarem em colapso, ficando abaixo do nível de custo para as usinas nucleares”, disse Patrick Hummel, analista do UBS em Zurique. “Isto realmente é um golpe duplo para as geradoras de energia. Menos horas em operação significa que menos energia é vendida, e isso acontece quando o preço está baixo.”

A energia vendida com um dia de antecedência ficou em média em € 37,40 no primeiro semestre na Epex de Paris, o menor nível desde 2007. Na sexta-feira, energia com um dia de antecedência foi vendida a € 26,24 em um leilão.

Em 16 de junho, um domingo, as usinas geradoras de energia solar e eólica forneceram 60% da demanda da Alemanha, um recorde segundo o instituto de pesquisas International Forum for Renewable Energies, de Münster, forçando as operadoras de usinas nucleares RWE, EON e EnBW (Energie Baden-Wuerttemberg) a reduzir a geração depois que os preços caíram abaixo de zero. Este é o nível em que as usinas precisam pagar aos consumidores para distribuir energia.

“Os atuais preços baixos nas bolsas têm consequências dramáticas para as operadoras de usinas convencionais”, afirmou Hildegard Mueller, presidente do conselho administrativo do entidade lobista BDEW de Berlim. “Elas ficam imaginando como vão ganhar dinheiro com suas usinas. As companhias agora enfrentam a questão de como vão desenvolver seu modelo de negócios no futuro.”

Em 16 de junho, a RWE, com sede em Essen, reduziu a produção na usina Gundremmingen-C em 58%, para cerca de 550 megawatts, e a produção em Gundremmingen-B em 54%, para 600 megawatts por cerca de duas horas, segundo dados compilados pela Bloomberg.

No mesmo dia, a EON reduziu a produção em seu reator nuclear de Grohnde, com capacidade de 1.360 megawatts, para menos de 1.200 megawatts durante 15 horas, e também a geração no reator Isar-2, com capacidade de 1.400 megawatts, por três horas, segundo a Genscape, de Louisville, Kentucky, nos Estados Unidos, que monitora a produção de energia em 13 países da Europa. O maior reator da EON – Brokdorf, com capacidade de 1.410 megawatts – operou por quatro horas abaixo dos 1.200 megawatts.

A capacidade da unidade Neckarwestheim-2 da EnBW, de 1.395 megawatts, caiu para abaixo dos 1.200 megawatts por 18 horas naquele mesmo dia, segundo a Genscape.

Friederike Eggstein, porta-voz da EnBW, de Karlsruhe, Alemanha, e Petra Uhlmann, uma porta-voz da EON, de Dusseldorf, não responderam a dois telefonemas e dois e-mails da Bloomberg para comentar o assunto.

Segundo a Genscape, a utilização total de capacidade em 16 de junho caiu para 60% em nove reatores alemães, em comparação a 64% em 15 de junho. Um dia depois, ela subiu para 65%. “Nossas usinas nucleares não são mais aquelas geradoras contínuas de caixa que alguns ainda pensam ser”, afirmou Bernhard Guenther, diretor financeiro da RWE, em uma conferência telefônica com jornalistas em 15 de maio.

As energias renováveis estão se destacando tanto na rede elétrica da Alemanha que as usinas movidas a gás natural não registram lucros há 17 meses, segundo um cálculo da Bloomberg que leva em conta os preços da energia e os custos do combustível e das emissões. A operação dos reatores é mais barata que a das usinas movidas a linhito, carvão e gás na base do custo marginal, segundo Chris Rogers, analista da Bloomberg Industries em Londres.

A produção de energia solar atingiu o pico de 23.203 megawatts em 16 de junho, quase 13 vezes a média dos últimos 12 meses, segundo dados da EEX. Os preços para o mesmo dia chegaram a ficar € 225 negativos entre as 5h e as 8h no horário de Berlim naquele dia, e os contratos mudaram de mãos a menos € 100 das 14h às 16h, segundo informações da Epex.

A premiê Angela Merkel decidiu em 2011 fechar oito usinas nucleares alemãs e desativar as demais até 2022, depois do desastre na usina japonesa de Fukushima.

O apoio da opinião pública alemã ao plano de € 550 bilhões de expansão da energia eólica e solar vem aumentando, mesmo depois de os subsídios do governo para a “Energiewende”, ou mudança de energia, terem aumentado as contas de luz. Em pesquisa feita pelo instituto Forsa para a revista “Stern”, em abril, 59% apoiaram o fim da energia nuclear na Alemanha, em comparação a 54% um ano antes.

A energia nuclear representou 16% de toda a energia gerada pelo país no ano passado, número que foi de 18% em 2011, segundo dados da BDEW.

A margem operacional média em 15 usinas europeias foi de 12% no ano passado, a menor desde 2002, segundo a Bloomberg. No caso da EON ela caiu para 3,7%, em comparação a 23% há dez anos. Na RWE, a margem caiu de 14% em 2003 para 7,3%.

O lucro líquido da RWE ajustado para 2012 caiu 27% em comparação a 2008, enquanto que na EON a queda foi de 25% no mesmo período, segundo mostram os relatórios anuais das duas companhias.

À medida que a Alemanha avança em direção à meta de Merkel, de obter 35% da energia consumida pelo país de fontes renováveis até 2020, em comparação aos atuais 22%, aumentam muito as negociações intradiárias nas bolsas. No mês passado, contratos futuros cobrindo um período de entrega de até 15 minutos subiram 9%, para o total sem precedentes de 260.668 megawatts-hora em comparação a maio, segundo a Epex.

“Precisamos promover nossas usinas mais e mais nos mercados intradiário e de um dia de antecedência, por causa do avanço das energias renováveis”, diz Joerg Stockhecke, que trabalha na unidade de análise de mercado e otimização de usinas da Stadtwerke Bielefeld e está no mercado há 19 anos. “Isso basicamente nos transformou em operadores intraday”, acrescentou.

Ele comercializa cerca de 330 megawatts de capacidade de produção. Seu portfólio inclui 227 megawatts da usina de Grohnde, com capacidade de 1.360 megawatts e localizada no norte da Alemanha. Ela é majoritariamente controlada pela EON.

A Alemanha acrescentou 344 megawatts à sua capacidade de geração de energia solar em maio, elevando-a para 33.877 megawatts, ou 19% da capacidade instalada, segundo a autoridade reguladora do setor elétrico do país. Os parques eólicos, localizados principalmente em terra firme, representam 17%.

A produção total de energia solar e eólica caiu 6,4% no primeiro semestre deste ano, para 22,4 terawatts-hora, segundo dados do International Economic Forum for Renewable Energies.

“Quando o verão finalmente começar na Alemanha e a geração de energia solar render tudo o que pode, a energia solar apresentará uma reação, depois de um primeiro semestre fraco”, afirmou Paolo Coghe, analista do Société Générale em Paris. “Se isso acontecer, então haverá uma boa chance de os preços caírem ainda mais.”

EcoDebate, 09/07/2013

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