Publicado em 9/dezembro/2015
Gabriela Vilas Boas, da Assessoria de Imprensa da FFCLRP
Oxidação do glicerol possibilita obtenção da dihidroxiacetona, de alto valor agregado
Crescimento econômico com redução de emissões de gases. Essa parece a melhor solução para a equação que os países em desenvolvimento, como o Brasil, têm que resolver. Principalmente quando toda a sociedade espera ansiosamente por um pacto global que reduza as emissões de gases do efeito estufa que causa do aquecimento do planeta. E as discussões da vigésima primeira Conferência das Parques das Partes da Convenção-Quadro sobre Mudança do Clima, o COP21, realizada em Paris no final de novembro, mostram o tamanho do problema.
Nessa busca por produzir energia a partir de novas fontes renováveis, pesquisadoras do Laboratório de Eletroquímica e Eletrocatálise, do Departamento de Química, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, acabam de descobrir como gerar energia oxidando glicerol e ainda obter um subproduto de alto valor agregado, a dihidroxiacetona.
A técnica utilizada foi a oxidação dos álcoois, reação que quebra as ligações de carbono e as transformam em gás carbônico (CO2) ou carbonato (CO32-). Usando como álcoois o etanol e o glicerol, produziram eletricidade em baterias que podem ser alimentadas constantemente, as chamadas células de combustível (CC). Além disso, verificaram que, da queima do glicerol, resultou como subproduto, a dihidroxiacetona, que é vendida no mercado por R$214,00 o grama, enquanto que pelo glicerol, consegue-se apenas R$0,70.
Informa a pesquisadora responsável pelo trabalho, Lívia Martins da Palma, que atualmente o glicerol – também um subproduto da produção de biodiesel – é usado na indústria de cosméticos. Já a dihidroxiacetona é utilizada na fabricação de bronzeadores artificiais em cremes, loções ou a jato de bronzeamento artificial, nas vinícolas e também, na preservação do sangue em soluções fora do organismo. Como a dihidroxiacetona possui maior valor agregado, a geração de energia com a queima do glicerol pode se tornar mais vantajosa e lucrativa.
Quanto às vantagens para a produção de energia, usando o glicerol, não fica dúvidas. Trata-se de reciclagem de derivado do biodiesel, que não polui o meio ambiente e nem à saúde humana. E, comparando o seu uso em baterias, observa-se que, quando acaba o “combustível” armazenado nas baterias tradicionais, elas devem ser carregadas, ou seja, demanda tempo. Já as células de combustível possuem um tanque acoplado. “Portanto, quando se esgota o ‘combustível’ do tanque, é só reabastecê-lo”, afirma Lívia. Este processo é utilizado em motores estacionários, como geradores. Grandes empresas, como Honda e Toyota, já estão investindo nas células de combustível.
Como produzir energia limpa
Para investigar a oxidação do etanol e glicerol, Lívia empregou ligas de dois metais nobres, a platina e o paládio. Eles são resistentes à corrosão e oxidação, e conseguem acelerar a velocidade da reação química. Os metais foram inseridos num meio alcalino, que contém pH maior que sete, para reduzir custos e, também, aumentar a eficiência, gerando mais energia em menos tempo.
A célula a combustível é feita em duas partes. A primeira, no ânodo, polo condutor de corrente elétrica de um sistema, o combustível é oxidado, gerando elétrons que atravessam o circuito e que podem ser usados para gerar trabalho, como o funcionamento de um motor. Na segunda parte, os elétrons vão para o outro polo, chamado cátodo, onde o oxigênio será reduzido. “A reação de oxigênio é mais rápida em meio alcalino”, afirma a pesquisadora.
Para a obtenção de energia na célula é necessário que o combustível oxide por completo pelo catalisador, porém, isto muitas vezes não ocorre. “Quando a oxidação não se completa, formam-se os produtos intermediários, reduzindo a quantidade de energia obtida”, diz Lívia.
Alto custo ainda impede produção
A maior dificuldade deste processo de obtenção de energia ainda está nos custos, pois o material do ânodo e cátodo baseiam-se em platina, metal nobre muito caro. Outro ponto importante são os modelos de células a combustível que estão entrando no mercado. Estas usam hidrogênio como combustível que, apesar de ser altamente eficiente, ainda é muito caro e sua produção polui o meio ambiente. “Além de ser um gás que requer um tanque grande, é mais complicado na hora do abastecimento”, afirma a pesquisadora, garantindo ser mais fácil quando o combustível é líquido.
No Brasil e no mundo, existem vários grupos pesquisando células a combustível e diminuição de seus custos. No entanto, as pesquisadoras da USP festejam o grande diferencial obtido em seu modelo, o produto dihidroxicetona. “A vantagem é usar um sistema consorciado, onde se gera energia e produz concomitantemente produtos com maior valor a partir de um subproduto do biodiesel. Assim, não teremos desperdício, muito pelo contrário, teremos mais lucro”, afirmam.
A próxima etapa do trabalho é diminuir a quantidade de platina/paládio a ser empregada nos eletrodos para baratear e viabilizar o uso da tecnologia das células a combustível.
Os resultados da química Lívia foram obtidos em sua tese de doutoradoDesenvolvimento de células a combustível de álcoois direta: produção de protótipos de alta potência, defendida em maio deste ano, sob orientação da professora Adalgisa Rodrigues de Andrade, do Departamento de Química, da FFCLRP.
Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Mais Informações: ardandra@ffclrp.usp.br
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