quarta-feira, 30 de julho de 2014

Alimentos enriquecidos são aposta no combate à fome oculta

28/07/2014

Dois bilhões de pessoas sofrem de deficiência nutricional por não consumirem vitaminas e minerais essenciais. Agregar esses nutrientes a alimentos básicos pode ser uma saída.
Uma boa notícia: apesar do aumento constante da população mundial, o número de pessoas subnutridas está diminuindo. Entre 1900 e 1992 elas eram mais de 1 bilhão, e hoje são 842 milhões, estima a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO).

Mas esse número esconde que cerca de 2 bilhões de pessoas sofrem da chamada fome oculta, ou seja, a carência no organismo de vitaminas e minerais vitais. Essa falta pode causar doenças graves ou o enfraquecimento do sistema imunológico, o que, por sua vez, pode levar a danos permanentes, como a cegueira.

A fome oculta foi o tema de um estudo das organizações suíça Terre des Hommes e da alemã Welthungerhilfe, publicado nesta terça-feira (22/07), que revelou que a Índia, Bangladesh, a Ásia Central e muitas partes da África são as regiões onde a população mais sofre com a carência de nutrientes.

Para especialistas em nutrição, esse problema é tão grave quanto a fome. “No leste e no sul da África, as pessoas comem, com frequência, somente angu de milho”, diz o secretário-geral da Welthungerhilfe, Wolfgang Jamann, que há anos trabalha nessa região.

“Com isso, as pessoas ficam saciadas, mas, devido à alimentação desequilibrada, faltam vitaminas vitais”, completa. O mesmo fenômeno acontece em regiões onde se consome predominantemente arroz. “Com frequência, infelizmente, é apenas arroz branco descascado, e então faltam também as vitaminas, que são perdidas com a casca”, reforça o especialista.

Doenças e pobreza
Arroz dourado não se mostrou eficiente nas Filipinas [Foto: cc-by-nc-sa IRRI Images]

Entre 300 mil e 700 mil crianças morrem e outras 300 mil ficam cegas anualmente em decorrência de doenças causadas pela deficiência de vitamina A, segundo a ONU. Outros nutrientes vitais são, por exemplo, o ferro e o ácido fólico.

Se gestantes ou mulheres que estão amamentado possuem carência de nutrientes, as crianças podem desenvolver também essa deficiência já no útero materno. Além disso, a falta de ácido fólico pode causar má formação no feto. A deficiência de ferro, de vitamina A, de zinco e de iodo também pode ter consequências graves para recém-nascidos e crianças pequenas.

“Mulheres que estão amamentando são frequentemente afetadas pela falta de ferro e vitamina A. Isso afeta também a saúde de recém-nascidos. Em casos graves pode evoluir para deficiências mentais, se as mães não ingerirem iodo suficiente”, conta Jamann.

O ideal seria que as pessoas ingerissem em sua dieta diária todos os nutrientes que precisam para ter uma vida saudável. Uma dieta rica em nutrientes compreende, além dos alimentos básicos, muitas frutas e verduras e, ocasionalmente, ovos, leite, peixe e carnes.

Mas, perante a dura realidade, muitas pessoas não têm dinheiro suficiente para ter uma alimentação saudável, afirma Jamann. Por isso, ele considera o enriquecimento de alimentos básicos um recurso prático.

Em 80 países, essa medida está até mesmo prevista na lei. Em Zâmbia, por exemplo, o milho é enriquecido com vitamina A e D. Além disso, há a possibilidade de se enriquecer os alimentos emcasa, misturando pó de multivitaminas na comida.

Geneticamente modificado

Outra abordagem promissora é a biofortificação. Ou seja, criar novas variedades de alimentos básicos, que retenham mais minerais ou que sejam mais ricos em vitaminas do que as originais. Assim, cientistas procuram, por meio de cruzamentos de variedades, melhorar a riqueza nutricional de plantas. Com frequência pode ser melhorada também a resistência contra pragas e secas.

Pesquisas com esse fim existem, por exemplo, na África, com batata doce, feijão, mandioca ou arroz. Na Índia ou no Paquistão, trigo, arroz e milheto estão sendo modificados. O filantropo Bill Gates aposta numa banana-da-terra com muita vitamina A.

Apesar de achar essas ideias interessantes, Jamann ressalta que as novas espécies precisam primeiro provar na prática seu potencial e aceitação pelos consumidores. “Muito do sucesso divulgado foi alcançado em laboratório. Ainda não é certo se as pessoas vão aceitar e usar as novas variedades”, reforça.

As primeiras pesquisas de campo do arroz dourado – uma variedade geneticamente modificada que possui muita vitamina A – nas Filipinas, por exemplo, decepcionaram. As variedades nativas, adaptadas ao clima da região, provaram ser mais robustas.

Mas a introdução de novas variedades na luta contra a fome oculta só faz sentido se os agricultores tiverem acesso às sementes melhoradas. Melhor ainda seria se eles pudessem simplesmente guardar sementes da safra passada. Mas isso só funciona se as sementes não forem híbridas, que precisam ser compradas para cada novo plantio.

“Pequenos agricultores também precisam ter condições de plantar essas sementes melhoradas. Eles não podem depender apenas de um grande fornecedor”, opina Jamann. O objetivo, acrescenta, é que os produtos não fiquem mais caros.

Fonte: DW

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