quinta-feira, 25 de setembro de 2014

‘Pensar a conservação ambiental é uma necessidade do agricultor familiar’

Dia 05/09 o Gambá promoveu o evento Ações Sustentáveis em São Miguel das Matas, foi uma conversa com os proprietários rurais do município sobre educação ambiental buscando sensibilizá-los a aderir à restauração de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e implantação de cercas vivas proporcionadas gratuitamente pelo Projeto Ações Ambientais Sustentáveis.

Dona Ignez Sant’Anna, 67, esteve presente contou os impactos positivos que a implantação de um bosque energético e de um trecho de cerca viva teve em sua propriedade, o Sítio Avante, no Tabuleiro da Santa, em São Miguel das Matas (BA). Seu depoimento ao público, complementado em uma conversa com a equipe do Gambá, mostra uma visão de mundo em que a preservação ambiental, mais do que compatível, está intimamente aliada à produção da agricultura familiar.

“Na minha propriedade tem o bosque energético e a cerca viva, os dois em parceria com o Gambá. O bosque energético tem uns 6 anos, já dá pra tirar umas estacas e lenha a hora que quiser. Ainda não dá para parar de usar gás, porque o pedaço é pequeno. A cerca viva mais velha, que tem uns 3 anos já funcionando, não precisa de mais estaca no lugar. A parte nova, com dois anos ou um ano e meio, ainda tá pra ser podada e trabalhada. Essa parte mais velha foi feita com o Gambá, a parte mais nova é que a gente tirou do bosque energético pra dar continuidade em outra parte do terreno. O Primeiro benefício é não ter que comprar estaca, porque é caro e a gente tem que descobrir de onde que elas tão vindo. E a madeira da região nem guenta na terra, ela apodrece, como também não se deve derrubar o pouco que tem. Então já facilitou a questão da compra de estaca. E também facilitou a questão do próprio ar que respiramos, como também dos pássaros que chegou pra comer a semente que ela produz. Esses são os três benefícios que ela trouxe.

A agricultura familiar e a preservação ambiental têm que andar juntas, de braços dados. Porque mesmo a pouca quantidade de terra que se tem, sendo bem dividida dá pra muita coisa, entendeu? O próprio reflorestamento ajuda no desenvolvimento das outras plantas e verduras, porque o meio ambiente é um todo, ele não é separado.

Tem muitos lugares que as nascentes já secaram, que têm dificuldade com água. E outros são serras que não fizeram nada pra prevalecer as matas e hoje estão tendo dificuldades. Foi por conta de desmatamento em volta das nascentes que aconteceu esse processo. Agora [o produtor rural] precisa ser reeducado. Eu vi isso acontecendo, esse desmatamento. Pra gente vir de casa até aqui era dois terços debaixo de árvore, hoje a gente quase não acha uma árvore pra poder descansar se vier de pés.

Na minha vida eu vi muito desmatamento, muita queima. Ainda hoje você vê fazendeiro que tem cajueiro no terreno, na pastagem, como eles sabem que não pode derrubar eles derrubam com trator e jogam nos córregos. Finge que caiu e esquece que o próprio cajueiro é alimentação pro gado.

É essa a questão que eu digo que os jovens, se aprenderem na escola, com os livros falando na linguagem da agricultura familiar, a linguagem do campo, podem reeducar os pais e a sociedade. Pra mim, a escola do campo tem que ser divulgada, praticada, pra que haja uma mudança na sociedade. A escola [como temos hoje] afasta os jovens da agricultura, porque tudo que tem no livro não fala nada da agricultura. Quando fala não é levando pra prática da agricultura, o pouco que fala é teórico, entendeu? Por isso cada vez mais os jovens tão saindo e enchendo as cidades. A outra coisa é a falta de condições que eles têm na agricultura, porque os produtos agrícolas não têm tabelamento, só o cacau. A farinha que é o maior produto dessa região não tem tabelamento. A farinha tá 60 reais um saco de 50 kg.

Para mim, pensar na conservação ambiental é uma necessidade do agricultor familiar. Não só uma necessidade econômica, mas também pra própria saúde do homem e do globo todo. Para mim, o que se aproveita das palestras e atividades como essa é olhar o funcionamento do conjunto e não de cada coisa isolada. Precisa bater um pouco nisso ainda, porque o agricultor tem essa visão, mas é preciso o incentivo e a educação constante. É preciso convencer alguns agricultores mais idosos da necessidade de ceder um espaço da sua propriedade para a preservação ecológica e também que o jovem possa sentir essa responsabilidade na própria pessoa dele e do conjunto”.


EcoDebate, 25/09/2014

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