sexta-feira, 9 de agosto de 2013

As potencialidades do ginseng brasileiro

Jornal da UNICAMP
Campinas, 04 de agosto de 2013 a 10 de agosto de 2013 – ANO 2013 – Nº 569

Pesquisa da FEA investiga o uso de compostos da planta pelas indústrias alimentícia,
farmacêutica, cosmética e petroquímica

Texto: MANUEL ALVES FILHO Fotos:  Antoninho Perri Edição de Imagens: Diana Melo
Pesquisa desenvolvida para a dissertação de mestrado da engenheira de alimentos Renata Vardanega resultou no depósito de pedido de patente de um processo de obtenção de um extrato a partir de raízes de ginseng brasileiro (Pfaffia glomerata). O extrato contém saponinas, compostos que são do interesse das indústrias alimentícia, farmacêutica, cosmética e petroquímica, visto que apresentam atividades surfactantes e medicinais. O trabalho foi defendido recentemente na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, sob a orientação da professora Maria Angela Almeida Meireles.

O método empregado para a obtenção do extrato, explica a autora do estudo, é mais simples e rápido que os processos convencionais, além de apresentar rendimentos muito superiores aos destes. “Nós utilizamos solventes considerados seguros e em menor quantidade. Além disso, obtivemos rendimentos bem superiores aos dos métodos já conhecidos. Conseguimos extrair cerca de 60% de extrato bruto em relação à matéria-prima. Outros processos alcançam um rendimento que varia de 2% a 40%”, compara Renata.

Em relação ao composto de interesse medicinal, a beta-ecdisona, a engenheira de alimentos conseguiu recuperar até 14%, enquanto outros processos de extração atingem um percentual de no máximo 5%. “Já quanto à atividade surfactante, chegamos a um índice de emulsificação de até 58%, cujo valor é similar ao surfactante sintético Dodecil sulfato de sódio (SDS), um dos mais utilizados atualmente, contra os 20% obtidos para extratos contendo saponinas provenientes de outras plantas”, confronta. Uma das novidades da técnica empregada foi o uso do ultrassom, que contribuiu para ampliar as taxas de recuperação dos compostos.

A utilização do ultrassom para essa finalidade, conforme a autora da dissertação, já era conhecida, mas o equipamento ainda não tinha sido aplicado para obtenção de extratos de ginseng brasileiro, somente para outras plantas. “Ou seja, nós tivemos que começar do zero, pois não sabíamos se a técnica poderia nos proporcionar bons resultados”, comenta Renata. Ela conta que decidiu pesquisar as propriedades do ginseng porque na literatura já havia a descrição de que a planta, que é nativa do país, contém saponinas.

O primeiro interesse da pesquisadora foi explorar as atividades surfactantes desses compostos para possível aplicação na indústria alimentícia. Dito de modo simplificado, o surfactante é uma substância que possibilita a interação entre compostos imiscíveis para a formação de emulsões, como a mistura entre água e óleo. “Nosso grupo da FEA é o primeiro no país a desenvolver esse tipo de estudo com o ginseng brasileiro. Nesse caso, nós extraímos o extrato da raiz da planta. Entretanto, pretendemos desenvolver novas pesquisas para explorar a planta integralmente, das raízes às partes aéreas”, adianta Renata. “As partes aéreas geralmente são abandonadas no campo quando a colheita é feita, porém poderiam ser utilizadas para algum fim”, acrescenta Diego Tresinari dos Santos, coinventor e coorientador da dissertação de mestrado.

O extrato obtido, reforça Renata, possui tanto saponinas que apresentam atividades surfactantes quanto medicinais. Entre as próximas providências a serem tomadas, segundo ela, estão a separação e a consequente caracterização desses compostos. “Precisamos conhecer melhor as propriedades destes compostos para saber a quais necessidades dos segmentos alimentício, farmacêutico, cosmético e petroquímico eles se adaptam melhor”, esclarece.

Parte dessas tarefas já está sendo cumprida pela própria engenheira de alimentos, que agora cursa o doutorado na FEA. Outras questões, como a viabilidade econômica do processo, o aproveitamento dos resíduos gerados pela extração dos compostos para diferentes fins e a avaliação do potencial de aplicação dos extratos obtidos, estão sendo alvo de estudos de outros pesquisadores que integram o Laboratório de Tecnologia Supercrítica: Extração, Fracionamento e Identificação de Extratos Vegetais (LASEFI), coordenado pela professora Maria Angela Almeida Meireles. O objetivo é o aproveitamento integral do ginseng, utilizando processos sustentáveis, de modo a fechar uma cadeia.

No caso dos resíduos das extrações, os pesquisadores pretendem utilizá-los como fontes de energia. “Nós fizemos testes preliminares e constatamos que isso é viável energeticamente devido ao seu alto poder calorífico. Adicionalmente, também foi avaliado um cenário em que segmentos das partes aéreas eram utilizados para o mesmo fim, similarmente ao que algumas usinas de açúcar e álcool começam a fazer, no Brasil, com a palha da cana-de-açúcar deixada no campo. Em ambas as situações, toda a quantidade necessária de eletricidade e vapor para a produção dos extratos, via métodos desenvolvidos no LASEFI, seria suprida pela combustão de tais biomassas”, detalha Diego.

“No entanto, precisamos avançar mais nos estudos para verificar a viabilidade econômica dessa rota. O que se vislumbra no momento é submeter os resíduos a altas temperaturas, de forma a quebrar as moléculas e obter açúcares que podem ser destinados à fermentação do etanol, por exemplo. Esta rota resultaria em produtos de valor agregado maior que a anterior, tendo-se coprodução de extrato com propriedades medicinais e surfactantes e etanol, criando-se, assim, a biorrefinaria do ginseng Brasileiro”, diz Renata. “Com o resíduo sólido da etapa de hidrólise ainda poderiam ser produzidos nanocristais de celulose, que podem ser utilizados como material de reforço em matrizes poliméricas, e por fim energia a partir do resíduo sólido gerado a partir deste último processamento”, complementa Diego.

Na opinião da autora da dissertação, embora o processo de extração desenvolvido experimentalmente ainda dependa de alguns aperfeiçoamentos, ele tem condições de ganhar escala e ser transferido para a iniciativa privada. “O método é relativamente simples. Isso sem falar que ele apresenta rendimentos significativamente maiores que as técnicas convencionais. Nossa expectativa é de que, em breve, ele possa fazer parte das etapas de produção da indústria”, antevê Renata, que destacou a importância do trabalho realizado pela Agência de Inovação Inova Unicamp no esforço para a proteção intelectual do trabalho.

“A Inova tem uma atuação muito importante, pois ela contribui para que nossas pesquisas sejam transformadas em processos e produtos de importância para o país e a sua população”, considera a autora do trabalho, que contou com bolsa concedida pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Já o projeto no qual o trabalho dela está inserido tem financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Publicações

Patente: Processo de Obtenção de um Extrato a Partir de Pfaffia glomerata. 2013, Brasil. Patente: Privilégio de Inovação. Número do registro: BR1020130128961, data de depósito: 24/05/2013, título: “Processo de Obtenção de um Extrato a Partir de Pfaffia glomerata”, Instituição de registro: INPI - Instituto Nacional da Propriedade Industrial.

Tese: “Obtenção de saponinas de raízes de ginseng brasileiro (Pfaffia glomerata) por extração dinâmica a baixa pressão assistida por ultrassom”
Autora: Renata Vardanega
Orientadora: Maria Angela de Almeida Meireles
Coorientador: Diego Tresinari dos Santos
Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)
Financiamento: Capes e Fapesp

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