terça-feira, 8 de abril de 2014

Técnica potencializa extração de compostos de duas plantas



Campinas, 07 de abril de 2014 a 13 de abril de 2014 – ANO 2014 – Nº 593

Engenheira de alimentos testa processo em folhas de pitanga e alecrim-pimenta

Texto: CARMO GALLO NETTO Fotos: Antoninho Perri Edição de Imagens: Diana Melo
Perde-se no tempo a utilização das plantas como os primeiros recursos terapêuticos utilizados pelo homem. No Brasil este conhecimento empírico nos foi legado pelos índios. Por meio da ciência se chegou aos fitoterápicos, medicamentos obtidos a partir de plantas medicinais com o emprego exclusivo de matérias-primas ativas vegetais. Para tanto, há necessidade de obter os extratos naturais e estudar as propriedades dos compostos bioativos que os constituem. Estes compostos estão presentes naturalmente nas plantas e constituem o seu mecanismo de defesa contra as adversidades do meio ambiente. São eles também os responsáveis por suas propriedades terapêuticas. É o caso da pitanga, utilizada pelos índios pelas suas propriedades anti-inflamatórias. Não há família brasileira que não conheça os atributos medicinais de infusões, chás, sucos, alimentos, provenientes de produtos naturais.

Hoje são recorrentes nos meios de comunicação as pesquisas que vinculam dietas à prevenção ou mesmo à cura de doenças, e são inumeráveis os sites que apresentam produtos naturais saudáveis. O estudo de plantas medicinais como fonte de medicamentos é advogado pela OMS e no Brasil, desde 2006, têm sido implementadas políticas para garantir acesso seguro e uso racional dessas plantas e de fitoterápicos. Fruto dessas iniciativas e de estudos desenvolvidos é a criação mais recente da Relação Nacional de Plantas Medicinais de Interesse para o SUS (Renisus), com vistas principalmente à utilização por pessoas de baixa renda.

Diante desse contexto, a engenheira de alimentos e atual doutoranda Tábata Tayara Garmus Diniz selecionou duas plantas que constam da Renisus e são de uso popular consagrado pelas propriedades terapêuticas - a pitanga (Eugenia uniflora L.) e o alecrim-pimenta (Lippia sidoides Cham), com o objetivo de estudar a composição dos extratos provenientes dessas duas matrizes vegetais e obtidos através de extração sequencial, em leito fixo – situação em que o solvente escoa através do leito de partículas estacionário formado pelas folhas secas e trituradas, empregando como solventes CO² supercrítico, etanol e água. 

As folhas de pitangueira são conhecidas por suas inúmeras atividades terapêuticas e usadas na medicina popular no tratamento de febre, doenças estomacais, hipertensão, obesidade, reumatismo, bronquite e doenças cardiovasculares. Hoje se sabe de sua ação calmante, anti-inflamatória, diurética e antioxidante. A medicina popular consagrou a utilização do alecrim-pimenta principalmente como antisséptico e antimicrobiano.

Destaque-se que atualmente existe um grande interesse em formulações que incorporam extratos oriundos de fontes naturais para a obtenção de alimentos funcionais, de cosméticos ou produtos medicinais que contenham substâncias biologicamente ativas – antioxidantes, óleos essenciais, carotenoides, compostos fenólicos, flavonoides, entres outros. Assumem particular importância os compostos fenólicos e os flavonoides, cujas ações antioxidantes, eliminando radiais livres, os tornam potenciais protetores contra cânceres e doenças do coração.

Parte do trabalho desenvolvido na pesquisa, orientada pelo professor Fernando Antonio Cabral e coorientada pela professora Losiane C. Paviani, ambos do Departamento de Engenharia de Alimentos da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, foi apresentado no artigo “Extraction of phenolic compounds from pitanta (Eugenia uniflora L.) leaves by sequential extraction in fixed bed extractor using supercritical CO², ethanol e water as solvents” publicado no periódico The Journal of Supercritical Fluids.

Tendências

A busca por extratos naturais com potenciais ativos de grau alimentício é uma tendência na indústria de alimentos. A extração é um passo muito importante no isolamento, identificação e utilização de compostos presentes nesses extratos e não existe um método de extração padrão. Como consequência, têm atraído particular interesse pesquisas voltadas para um aperfeiçoamento das técnicas de extração e na busca por novas fontes de extratos naturais e seus constituintes.

Nos últimos anos houve o crescimento no consumo de produtos enriquecidos com antioxidantes naturais, como vitaminas e compostos fenólicos, ou dos vegetais e seus extratos, que os contenham em abundância como chás e frutas. Essa tendência é resultado da preocupação crescente do consumidor com a saúde.

Para Tábata, “embora haja evidências científicas dos efeitos benéficos dos compostos fenólicos, há uma clara necessidade de se intensificar a pesquisa nessa área, bem como esclarecer os consumidores de sua importância”.

Método

O mestrado de Tábata centrou-se principalmente no desenvolvimento de um método para extrair de maneira mais eficiente fenóis e flavonoides, que constituem os principais compostos bioativos responsáveis pelas propriedades das duas plantas selecionadas. Como não existe um método único que sirva a extrações desses e de outros compostos bioativos que possa ser utilizado em todas as plantas, é necessário pesquisar o melhor processo para cada caso.

Nesses processos, a extração com etanol é uma das mais utilizadas, embora exija depois a separação do solvente para obtenção do extrato seco. Um dois maiores problemas da utilização desse e de outros solventes orgânicos é o fato de ser praticamente impossível a remoção de todo solvente residual sem um grande dispêndio de energia e envolvimento de custos, além do risco do solvente promover a formação de compostos secundários indesejáveis. Constitui exemplo da aplicação prática do etanol um medicamento fitoterápico desenvolvido por uma universidade brasileira que nada mais é do que um extrato etanólico da folha de alecrim-pimenta utilizado como antisséptico e antimicrobiano nos casos de ferimento.

Também muito empregada, a extração aquosa é realizada principalmente através dos processos de hidrodestilação ou destilação por arraste de vapor. A desvantagem dessas técnicas é que elas não podem ser usadas quando existem compostos passíveis de degradação a temperaturas próximas de 100°C.

A busca por extratos de melhor qualidade e livres de traços de solventes levaram a pesquisa de processos alternativos de extração. O CO² supercrítico, de uso mais recente como solvente, apresenta a vantagem de uma substância não tóxica, inodora, de fácil obtenção e eliminação do extrato.

No estado supercrítico, o CO² assume propriedades tanto de gases como de líquidos e possui maior capacidade como solvente. Esse estado é delimitado pelo ponto crítico, caracterizado por certa temperatura e pressão (críticas) cujo valor é diferente para cada solvente. Uma substância está no seu estado supercrítico quando os valores de sua temperatura e pressão excederem a temperatura e pressão do ponto crítico. Para o CO², a temperatura crítica é de 31°C, relativamente baixa e, portanto de fácil operacionalização.

Para a obtenção de extratos naturais a partir de folhas de pitangueira (Eugenia uniflora L.) e de alecrim-pimenta (Lippia sidoides Cham.), Tábata combinou três processos de extração. Os extratos foram obtidos por extração sequencial, em leito fixo em três etapas, ou seja, três solventes distintos passaram através do mesmo leito de partículas formado pelas folhas secas e trituradas, de cada matriz vegetal, a 60°C e 400 bar. A primeira etapa foi a extração com dióxido de carbono supercrítico, seguida pela extração com etanol e depois pela extração com água. Todos os extratos foram avaliados quanto ao teor de fenóis e flavonoides totais. 

Para avaliar as vantagens e desvantagens da técnica proposta e poder inclusive comparar seus resultados com os obtidos em etapa única, a pesquisadora obteve a partir das matrizes vegetais extratos em mais duas situações: 1) extratos, em etapa única, utilizando etanol e água em leito fixo, a 60°C e 400 bar, sem a utilização inicial da extração com COsupercrítico; 2) extratos etanólicos e aquosos, obtidos pelos métodos convencionais, ou seja, à baixa pressão (0,93 bar) e mantida a temperatura de 60°C. Ela mediu então o rendimento global de extração, concentração e rendimento de fenóis e flavonoides totais de todos os diferentes extratos obtidos.

Resultados

Ao se propor realizar a extração em três etapas sequenciais Tábata, alicerçada em resultados colhidos em uma revisão bibliográfica e face às diferentes características dos solventes utilizados, esperava que na etapa inicial com CO² supercrítico ocorresse a retirada dos compostos que não eram do seu interesse, restando na planta aqueles que pretendia estudar e que seriam extraídos com mais facilidade nas etapas posteriores (etanólica e aquosa). A literatura apontava nessa direção e a escolha das folhas de pitangueira permitiria estabelecer comparações com estudos já realizados. O alecrim-pimenta foi utilizado para testar a reprodutibilidade e extensão do método.

O estudo mostrou que o processo de extração sequencial, em três etapas, foi o mais eficaz quando se deseja obter extratos com alto rendimento global de extração e de fenóis e flavonoides totais. As extrações etanólicas e aquosas antecedidas pela extração supercrítica foram as que apresentaram maior concentração de fenóis e flavonoides quando comparadas com as extrações sem a prévia extração supercrítica, principalmente em relação às folhas de pitanga. De certa forma, é como a extração supercrítica abrisse os canais para a ação do etanol e da água.

No geral, a extração sequencial em três etapas, nas condições estudadas de temperatura e pressão, mostrou-se eficiente na extração de compostos bioativos para as duas matrizes vegetais.

Publicação

Dissertação: “Obtenção de extratos de folhas de pitanga e de alecrim-pimenta por extração sequencial em leito fixo usando CO² supercrítico, etanol e água como solventes”
Autora: Tábata Tayara Garmus Diniz
Orientador: Fernando Antonio Cabral
Coorientadora: Losiane C. Paviani
Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)

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