Ler a bula dos remédios ou pesquisar sintomas na internet pode levar ao perigoso efeito nocebo. Excesso de informação faz com que paciente inconscientemente desenvolva doenças por medo, alerta neurologista.
“A expectativa determina o desenvolvimento de doenças”, afirma o neurologista Magnus Heier. Ele também é jornalista científico e estuda a influência do subconsciente nos seres humanos. O que esperamos tem grande influência sobre o desenvolvimento de doenças, diz o especialista. Segundo Heier, podemos criar sintomas ou fazê-los desaparecerem.
Quem lê um artigo que diz que as radiações eletromagnéticas das antenas de celulares provocam doenças pode sentir dor de cabeça mesmo que a antena esteja desligada, afirma o neurologista.
Um paciente com câncer pode morrer muito mais rápido caso esteja convencido de que lhe restam apenas poucos meses de vida, mesmo que, de acordo com o diagnóstico, o tumor não esteja mais crescendo. Este é o chamado efeito “nocebo”, sobre o qual Heier escreveu um livro.
O medo provoca estresse, e o estresse causa doenças
Vítimas do efeito nocebo associam sintomas leves a doenças graves
“O efeito [nocebo] ocorre sobretudo quando se tem medo de uma doença ou do tratamento a ser enfrentado. Os efeitos colaterais ficam, então, muito mais fortes”, diz Heier. “Pacientes com câncer começam a se sentir mal quando entram na sala da quimioterapia, porque inconscientemente esperam sentir náusea após a sessão.”
Medo significa estresse para o corpo e pode debilitar o sistema imunológico. Assim, o corpo fica mais suscetível a infecções, e surgem dores que não deveriam exisitir, explica o especialista.
Outros estudos confirmam tal fenômeno, como os realizados por médicos das clínicas universitárias de Regensburg e Tübingen. Winfried Häuser, Emil Jansen e Paul Enck publicaram estudos sobre o efeito nocebo entre 1960 e 2011 em todo o mundo, tendo verificado e compilado os resultados obtidos.
Nocebo e placebo
O termo nocebo, em latim, significa “fazer mal,” enquanto placebo significa “agradar”. Trata-se basicamente do mesmo efeito, só que um é negativo e o outro, positivo. Ambos afetam as pessoas no ponto que elas menos podem controlar: o subconsciente.
Um placebo gera a convicção de que o paciente será ajudado. Muitas vezes, um medicamento que não contém nenhuma substância ativa, como uma simples solução de água com açúcar, tem o mesmo efeito que um medicamento de verdade.
O efeito placebo foi estudado a fundo. Ao ser pesquisado na biblioteca virtual do Ministério de Saúde dos EUA, o termo aparece quase 160 mil vezes. Já nocebo aparece apenas 180 vezes. Na Alemanha, o efeito negativo começou a receber atenção somente nos últimos anos.
Muita informação
Bulas listam todos os efeitos colaterias dos remédios, mesmo que raramente ocorram
“Se detecto em um paciente um leve estreitamento da artéria carótida – nada relevante, apenas um pequeno estreitamento – e faço o diagnóstico, sempre que o paciente tiver uma tontura, vai associá-la ao problema. Todo mundo sente tontura de vez em quando, mas o paciente fica com aquilo na cabeça, o diagnóstico fica ancorado em seu subconsciente,” afirma Heier.
Quando alguém tem medo de desenvolver um tumor, talvez não o desenvolva, mas o estresse pode deixar o paciente suscetível a outra doença. O efeito nocebo geralmente ocorre quando recebemos muita informação e não conseguimos ordená-las corretamente, especialmente ao buscar na internet por doenças e sintomas.
Já a bula dos remédios lista todos os possíveis efeitos colaterais, mesmo que alguns raramente se manifestem, ou seja, em algo como um em cada dez mil pacientes. As empresas farmacêuticas são, porém, obrigadas a detalhar todas as possibilidades.
Comunicação eficiente
Quem ficar preocupado ou tiver medo dos efeitos colaterais não deve simplesmente jogar o remédio no lixo ou se autodiagnosticar na internet. O melhor a fazer é consultar um médico, alerta Heier.
No entanto, até mesmo a comunicação médico-paciente pode desencadear medos no paciente, se o médico não for cuidadoso. “Uma conversa pode ter muita influência”, afirma Sasa Sopka, anestesista e diretor do centro de treinamento em educação médica da Universidade de Aachen.
Boa comunicação entre médico e paciente é essencial
O assunto, que já é tema de estudo dos estudantes de Medicina dos EUA há 30 anos, começou a fazer parte do currículo das universidades alemãs somente nos últimos anos. A disciplina Comunicação com pacientes é obrigatória na Universidade de Aachen desde 2005. “Nas aulas, fica claro que se pode alterar ou até influenciar negativamente os pacientes, caso a conversa não prossiga da maneira adequada”, diz Sopka.
Não escutar com atenção, não fazer contato visual, não levar o paciente a sério ou intimidá-lo pode ser nocivo. O médico também tem que ter cuidado para não usar um tom negativo e criar desconforto. Tudo isso pode ocorrer devido à falta de tempo, à pressão no trabalho ou porque os médicos querem ser transparentes sobre os possíveis riscos de um tratamento ou operação.
Caso se sinta alguma dor, se deve procurar um médico, enfatiza Heier. Exames preventivos também são indicados. Todo o resto deve ser feito com cautela, pois não se pode subestimar o efeito de bulas de remédios ou diagnósticos médicos na internet sobre o subconsciente.
Texto: Marlis Schaum (mas)
Revisão: Luisa Frey
Matéria da Agência Deutsche Welle, DW, publicada pelo EcoDebate, 22/01/2013
Link:
Nenhum comentário:
Postar um comentário