segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Elementos da poluição atmosférica modificam o DNA humano, revela pesquisa

Além dos males causados pela poluição atmosférica já conhecidos, cientistas acabam de detectar, pela primeira vez, uma modificação em DNA humano causada pela presença de dois aldeídos – acetaldeído e crotonaldeído – encontrados na fumaça do cigarro e nas emissões veiculares. “Esses aldeídos são mutagênicos e, em concentrações elevadas, podem levar ao desenvolvimento de câncer”, alerta a professora Marisa Helena Gennari de Medeiros, docente do Instituto de Química (IQ) da USP e pesquisadora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) de Processos Redox em Biomedicina (Redoxoma).

A constatação foi feita em um levantamento realizado em 2010, que analisou a urina de 82 pessoas, sendo 47 residentes na cidade de São Paulo e outros 35 moradores de São João da Boa Vista, município no interior do Estado. Os resultados mostram que a concentração de adultos – resultado da reação dos aldeídos com o DNA – foi significativamente maior nos moradores da capital paulista. “São Paulo tem uma característica incomum, se comparada a outras grandes capitais do mundo”, conta Marisa Helena. “Além dos poluentes normalmente encontrados em metrópoles semelhantes, aqui temos uma grande frota que utiliza o etanol.” A pesquisa excluiu fumantes, alcoólicos, pessoas com problemas de saúde e fazendo uso de suplementos alimentares e de medicamentos. Nos testes com a urina, os cientistas utilizaram técnicas ultrassensíveis como a espectrometria de massas.

Reparo do DNA – A pesquisadora explica que foi a primeira vez em que a urina foi utilizada como biomarcador para esse tipo de estudo. “É de conhecimento que a poluição atmosférica é um agente carcinogênico”, ressalta Marisa. “No entanto, ainda não se tinha um controle específico em relação aos danos causados no DNA humano e usando a urina como biomarcador”, explica.

A docente descreve que o que é descartado pela urina é justamente o produto do reparo do DNA. Ao entrar em contato com o organismo, os aldeídos se ligam à estrutura do DNA, modificando-a. Contudo, as enzimas que protegem a estrutura realizam um trabalho de “clivagem” (corte) na modificação promovida pelos aldeídos. “O resultado desse mecanismo é justamente o que conhecemos como reparo, que é o que acaba indo para a urina”, explica. Se o dano causado ao DNA não for reparado, pode levar a uma mutação e ao câncer. Marisa destaca ainda que a vantagem de se utilizar a urina é que trata-se de um método não invasivo.

Fator de risco – Na região metropolitana de São Paulo, onde circula uma frota de cerca de 7,4 milhões de veículos, aldeídos genotóxicos presentes na atmosfera são um grande fator de risco para a saúde da população.

Por isso, um aspecto importante da possibilidade de detecção de adutos de DNA na urina é o desenvolvimento de um método não invasivo que permita o monitoramento da exposição da população a aldeídos presentes na atmosfera. Esse monitoramento pode fornecer informações para a formulação de políticas públicas que reduzam os efeitos nocivos da poluição atmosférica. “Pretendemos ampliar esse estudo, analisando e comparando amostras de urina de moradores de diferentes bairros na cidade de São Paulo e de diferentes cidades”, conclui a pesquisadora.

O grupo responsável pelo estudo integra a rede de pesquisadores dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT), com apoio do Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Científico (CNPq), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) com o Programa Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid), e do Núcleo de Apoio à Pesquisa (NAP) da USP.

O artigo “Elevated α-Methyl-γ-hydroxy-1,N2-propano-2′-deoxyguanosine Levels in Urinary Samples from Individuals Exposed to Urban Air Pollution”, de Camila Garcia, Florêncio Freitas, Angélica Sanchez, Paolo Di Mascio e da professora Marisa pode ser lido por assinantes em http://pubs.acs.org/journal/crtoec.

Matéria de Antonio Carlos Quinto, da Agência USP de Notícias /Jornal da USP, publicada pelo EcoDebate, 13/01/2014

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