quinta-feira, 26 de junho de 2014

Nomes populares suscitam dúvidas e geram confusão

Sergio Sigrist, 06/03/2014

Nomes populares de plantas costumam gerar confusão. Deparei-me recentemente com um caso típico ao escrever sobre a "noz- moscada", a conhecida especiaria de sabor picante, originária da Indonésia, usada em várias receitas de pães, doces, carnes e muito apreciada na culinária internacional. A primeira fonte que consultei diz sobre a interação medicamentosa desta espécie.

Na medida em que consegui reunir mais material e me aprofundar na identificação das suas propriedades medicinais, constatei que a planta é mais conhecida por "ucuuba", cujo nome científico é Virola surinamensis, nativa da Região Amazônica, e que a noz-moscada (a especiaria) é a Myristica fragans. Ambas Virola surinamensis e Myristica fragans pertencem a mesma família Myristicaceae.

Em nosso país, alguns acham que a especiaria nasce espontaneamente. Mas esta confusão ocorre porque há outras plantas que também recebem o nome de "noz-moscada", principalmente porque o aroma é um pouco semelhante. Além da já citada Virola surinamensis temos a Cryptocarya moschata ("noz-moscada-do-Brasil" ou "canela moscada") e a Alpinia zerumbet (a famosa "colônia", planta da Farmacopeia Brasileira).

Mas de onde vem esses nomes? Qual a origem? Pode-se encontrar explicação conhecendo-se os diversos sistemas etnofarmacológicos no Brasil, que são bem heterogêneos. 

Nomes trazidos por colonizadores europeus se concentram no Sul do Brasil. Como exemplo, temos a "erva-cidreira" (Melissa officinalis) e "erva-doce" (Foeniculum vulgare). 

A influência da cultura africana é muito forte no Nordeste, especialmente no Estado da Bahia, onde os nomes das plantas são frequentemente associados a rituais religiosos, como "arruda" (Ruta graveolens) e "jambolão" (Syzigium jambolanum). Na Região do Semiárido, a influência indígena e africana são associadas a aspectos de más condições socioeconômicas, clima e vegetação típicas dessa região. Nomes bem conhecidos e originários dessa região são a "aroeira-do-sertão" (Myracrodruon urundeuva), "catinga-de-mulata" (Tanacetum vulgare) e "bamburral" (Hyptis suaveolens).

As denominações de origem indígena são relativas a muitas plantas nativas usadas por essas comunidades em todo o território nacional. Pode- se destacar a "caapeba" (Piper umbellatum), "abajeru" (Chrisobalanus icaco) e "urucum" (Bixa orellana).

Recebemos a influência de imigrantes chineses e japoneses e na época das grandes navegações, os portugueses colonizadores disseminaram várias espécies de uso culinário principalmente no Estado de São Paulo. Como exemplo temos o conhecido "gengibre" (Zizinber officinale), a "lichia" (Litchi chinensis), a "raiz-forte" (Wassabia japonica), a "canela" (Cinnamomum cassia) e o "cravo" (Eugenia caryophyllata).

Na Região Amazônica, devido a diversidade da flora nativa, o conhecimento de indígenas absorvido pelos caboclos, somado ao isolamento cultural da região, temos uma linguagem própria que influenciou fortemente o nome de diversas plantas medicinais, por exemplo "guaraná" (Paulinia cupana), "copaíba" (Copaifera officinalis) e "fava-de-tonca" (Dipteryx odorata).

Por fim, como resultado de pesquisas científicas realizadas principalmente em países europeus, passamos a adotar uma gama de nomes na forma em que apareceram. Alguns exemplos são "ginkgo-biloba" (Ginkgo biloba), "hipérico" (Hipericum perforatum) e "equinácea" (Echinacea purpurea).

Assim, não confundir as plantas é um desafio. É comum uma planta ter diversos nomes populares e ainda, diversas plantas possuírem o mesmo nome popular e aqui mora a confusão. Plantas diferentes possuem diferentes concentrações de princípios ativos nas suas partes, consequentemente o valor terapêutico atribuído também é diferente. A "hortelã-pimenta" é um nome dado a duas espécies distintas da família Lamiaceae (Ocimum gratissimum e Mentha sp.), que possuem diferentes composições em seus óleos essenciais. Por sua vez Ocimum gratissimum, em diferentes regiões, recebe nomes populares como "alfavaca", "alfavacão" ou "erva-cravo".

É muito importante ter uma identificação segura, com a espécie botânica definida e o nome binomial latino correto e atualizado: primeiro o gênero e depois a espécie grafados geralmente em itálico. Ao contrário do nome vulgar, cujo âmbito de validade é regional, o nome binomial (científico) é reconhecido como único em todo o mundo. Desta forma fica mais fácil o entendimento entre especialistas de diferentes países.

Referências

SALVI, R.M.; HEUSER E. D. Interações medicamentos x fitoterápicos: em busca de uma prescrição racional. EDIPUCRS, Porto Alegre, 2008.
RODRIGUES, V. E. G.; CARVALHO, D. A. Plantas Medicinais nas Florestais Semideciduais. Editora UFLA, Lavras, 2010.
CORRÊA JR., C. et al. Cultivo de plantas medicinais, condimentares e aromáticas. Editora FUNEP, Jaboticabal, 1994.


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