sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Peso favorável

Tese da Faculdade de Medicina revela que a obesidade pode contribuir para a saúde do idoso

Luana Macieira
Alline: hábitos saudáveis podem influenciar mais que o peso

A obesidade não é fator preponderante para que as pessoas vivam menos. Pelo menos para um grupo de idosos de Bambuí, no Centro-Oeste de Minas, acompanhados durante 10 anos por pesquisadores da Faculdade de Medicina e do Instituto René Rachou. A constatação está no centro da tese de doutorado defendida por Alline Maria Beleigoli, no Programa de Pós-graduação de Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto da Faculdade de Medicina da UFMG, uma das vencedoras do Prêmio Capes de Tese 2013. O objetivo foi observar se o excesso de peso e o tamanho da circunferência abdominal influenciavam na mortalidade de idosos.

O estudo abrange 1.606 idosos que tiveram seu peso monitorado entre 1997 e 2007. Ao longo do período, eles foram acompanhados anualmente por meio de entrevistas e exames feitos pela professora da Faculdade de Medicina Maria Fernanda Lima Costa.No caso das medidas antropométricas, foram considerados os padrões da Organização Mundial de Saúde (OMS). Para calcular se um idoso apresentava sobrepeso, obesidade, peso normal ou desnutrição, a pesquisadora calculou o Índice de Massa Corporal (IMC) e o tamanho da circunferência abdominal dos indivíduos. No início do estudo, 514 idosos apresentavam sobrepeso e 189 eram obesos.

A hipótese era de que idosos com sobrepeso (IMC entre 25 e 29,9) ou que apresentassem obesidade (IMC maior ou igual a 30) estariam mais propensos a morrer. Mas os dados obtidos não corroboraram com essa suposição. Segundo a pesquisadora, as constatações do estudo reforçam a tese do chamado “paradoxo da obesidade”, fenômeno já conhecido por pesquisadores da área de saúde. “Usando os dados dos idosos da pesquisa de Bambuí, percebemos que aqueles que tinham sobrepeso ou eram obesos classe 1 viveram mais que os idosos que apresentavam peso normal. Damos a isso o nome ‘paradoxo da obesidade’, que é quando chegamos à conclusão de que uma pessoa acima do peso pode ser saudável”, aponta.

Reserva metabólica

Em sua pesquisa, Alline Beleigoli aponta justificativas para os resultados encontrados. A primeira delas é a importância que a gordura corporal pode ter no corpo do idoso, servindo como reserva metabólica que ajuda em sua recuperação em caso de doença. Uma segunda explicação abrange o modo como as medições de IMC são realizadas, pois, segundo Beleigoli, o cálculo leva em conta massa magra e massa gorda. Assim, uma pessoa com IMC elevado pode não ser obesa.

Já a terceira justificativa para os resultados da pesquisa baseia-se na suposição de que os idosos que começaram a ser acompanhados em 1997 podem ter falecido nos anos posteriores devido a problemas relacionados ao sobrepeso, à obesidade e à grande circunferência abdominal: 521 morreram no decorrer da pesquisa. “O acompanhamento dos idosos da nossa pesquisa começou em 1997 e nessa época todas as pessoas envolvidas já tinham mais de 60 anos. O que pode ter acontecido é que as pessoas em que a obesidade era realmente um problema de saúde faleceram antes de 2007, o que fez com elas não fossem acompanhadas pelo nosso estudo. Isso nos leva a crer que sobrepeso e obesidade não são ruins para todo mundo”, aponta.
Análise de peptídeos

A segunda etapa da pesquisa baseou-se na análise da relação entre a mortalidade e a presença do peptídeo natriurético tipo B no organismo dos idosos. Esse peptídeo, produzido pelo coração quando o organismo apresenta algum tipo de sobrecarga, aumenta a quantidade de urina gerada pelo organismo e a consequente eliminação de sódio do corpo.

“Quando a pessoa tem pressão alta ou doença cardíaca, por exemplo, o natriurético tipo B se eleva no sangue. Como a obesidade é um estágio em que o indivíduo apresenta sobrecarga por possuir uma massa maior, queríamos descobrir se pessoas com maior IMC e maior circunferência abdominal apresentariam aumento das taxas desse peptídeo no sangue”, diz a pesquisadora.

A análise dos dados, mais uma vez, levou ao “paradoxo da obesidade”, uma vez que foi constatado que as pessoas de peso normal apresentavam nível desse peptídeo superior ao registrado em pessoas obesas e com IMC e circunferência abdominal altos. “Além eliminar sódio, esse peptídeo reduz a quantidade de tecido adiposo, o que nos levou a refletir: se os obesos têm menos peptídeo, será que eles não estão obesos justamente por causa disso? Será que o peptídeo baixo não é uma das causas desses idosos serem obesos? A continuação da pesquisa poderá esclarecer esse assunto”, diz Beleigoli.

Segundo a pesquisadora, as conclusões do estudo são importantes para os profissionais da área de saúde que têm o costume de indicar pesos ideais para os seus pacientes. “Eles às vezes falam para o paciente idoso que é preciso ter o peso ‘x’. Essa pesquisa indica que não é bem assim, pois idosos que faziam atividade física e não fumavam viviam muito mais, independentemente do peso. O mais importante é promover os hábitos de vida saudáveis e não apenas controlar o peso. Existem pessoas com sobrepeso e obesidade de classe 1 que são saudáveis”, conclui.

Tese: Relações entre medidas antropométricas, peptídeo natriurético tipo B e mortalidade em dez anos de idosos do estudo de Bambuí sobre saúde e envelhecimento
Autora: Alline Maria Rezende Beleigoli
Orientador: Antônio Luiz Pinho Ribeiro
Defesa: em agosto de 2012 no Programa de Pós-graduação em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto da Faculdade de Medicina da UFMG

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