Texto gentilmente cedido pelo Neto Geraldes (historiador e médico) do blog: Xarope de letrinhas (http://netogeraldes.blogspot.com.br/)
Data: 25.02.2013
Estátua no Museu de Cos, possível representação de Hipócrates
A cultura, metodologia e ética profissional peculiar e exemplar do médico do século V aC. levou a a Medicina a ocupar os primeiros lugares na escala de valores culturais do homem grego. A respeito disso, Werner Jaeger diz:: "Pode-se afirmar sem exagero que sem o modelo da Medicina seria inconcebível a ciência ética de Sócrates, a qual ocupa lugar central nos diálogos de Platão.”. Jaeger diz ainda que a medicina conseguiu essa posição de sucesso devido a dois fatores principais: possuir na época representantes espiritualmente elevados e ter se afastado da filosofia.
Hipócrates surgiu na escola de Cós e tornou-se seu maior expoente, não por ter criado uma nova medicina, mas principalmente por ter introduzido o método, a observação sistemática e exaustiva do paciente, aproximando a medicina da ciência como a entendemos hoje. Embora não fossem ateus, -os deuses eram invocados nos juramentos- Hipócrates e seus seguidores separaram-se da medicina sacerdotal, da aceitação da causa sobrenatural para os padecimentos humanos. Não esperavam dos deuses nem milagres, nem catástrofes.
Uma das características marcantes da medicina hipocrática foi a extensa produção de literatura própria e estão compiladas no Corpus Hipocraticum, uma coleção de tratados e escritos médicos que a tradição atribuiu a Hipócrates, mas que na verdade foi escrita por diversos autores em diferentes épocas. O Corpus Hipocraticum é composto por cerca de 70 livros, sobre variados assuntos e foi redigido em sua maioria entre 430 e 330 aC, como nos afiança Claude Mosse, os primeiros deles provavelmente de autoria do próprio Hipócrates. Outros foram escritos por seus discípulos e ainda vários outros foram acrescentados posteriormente até o século I aC. A análise desses textos nos permite uma boa visão da chamada medicina hipocrática, e entender porque ela influenciou tanto o pensamento médico ocidental.
A desacralização dos eventos médicos é constante na medicina hipocrática, sendo abordada em diversos livros e tratados da coleção. Em A Doença Sagrada, que trata da epilepsia, essa posição é muito clara quando diz que “nenhuma doença é mais divina ou humana que as outras, todas tem uma causa natural.” Prosseguia dizendo que a suposta origem divina da chamada Doença Sagrada vinha da ignorância das pessoas e de suas dramáticas manifestações.
Um dos livros mais conhecidos do Corpus Hipocraticum é o Dos Aforismos, que contém numerosas máximas que sintetizam o conhecimento da medicina hipocrática e fez parte do currículo médico em várias escolas europeias até o século XIX. Alguns desses aforismos se tornaram clássicos, como o primeiro deles: “A vida é curta, a arte longa, a ocasião fugidia, a experiência enganosa e o julgamento difícil” do qual derivou o ditado latino: “Ars longa, vita brevis”, ou “Para doenças desesperadas, remédios desesperados”, ou “Os muito gordos estão mais sujeitos à morte súbita do que os muito magros” ou ainda “O que a medicina não cura, o ferro cura; o que o ferro não cura, o fogo cura; o que o fogo não cura é incurável”.Continuaremos com o tema nos próximos posts.
Posted by Neto Geraldes
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