quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Artesanato e identidade cultural no Sisal

Atualizado em 28 de janeiro de 2013 ás 20:21


Pesquisa da UFBA reconhece o artesanato como elemento consolidador da cultura local no Território do Sisal

POR NÁDIA CONCEIÇÃO* nadconceicao@gmail.com

O artesanato, atividade que movimenta a economia de muitas cidades, é compreendido como elemento importante para a identidade cultural no Território do Sisal. A prática é objeto do grupo de pesquisa do Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social (CIAGS), da Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia (ADM –UFBA), coordenada pela professora Tânia Fisher. O projeto “Maestria em artes e ofícios populares: mapeamento dos mestres artesãos e seus saberes populares no Território do Sisal” busca catalogar os grupos culturais da região.

A pesquisa, financiada pela Fundação de Amparo à pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), por meio do Edital Semiárido de 2007, teve o objetivo de investigar os fenômenos sociais representados pelo surgimento dos ofícios artesanais, bem como sua diversidade, tendo como ênfase: 1) os artesão e sua produção enquanto natureza e 2) a trajetória das formas organizativas e tecnológicas de difusão dos saberes populares. O trabalho foi desenvolvido em 10 municípios: Valente, Conceição do Coité, Araci, Barrocas, Lamarão, Ichu, Teofilândia, São Domingos, Tucano e Retirolândia.
Mestre Santinha trancando sisal – (VALENTE -BA) Foto: divulgação SIAGS-UFBA

Além do mapeamento dos mestres artesãos e da caracterização das artes e ofícios populares, a pesquisa também foi importante para sistematizar os saberes populares de caráter artesanal, que são “entendidos como tecnologias sociais em si mesmos e como parte de redes e núcleos de cadeia de produção”, conforme descrito na publicação do grupo. Também foi realizada uma análise dos saberes com o objetivo de “criar critérios de análise da qualidade do desempenho” para identificar mestres em artes e ofícios como indivíduos referenciais. O projeto forneceu subsídios para a instalação de um museu contemporâneo de artes e ofícios populares, vivo e interativo.

O projeto culminou, ainda, em três produtos: um catálogo, que além de outras informações da pesquisa, contém 23 depoimentos dos artesãos mapeados, um documentário e um site. De acordo com um dos pesquisadores, o gestor de comunicação do CIAGS e um dos idealizadores da pesquisa, Rodrigo Maurício Soares, os estudos consideraram como mestres artesãos “pessoas que têm muita experiência e conhecimento dos saberes e fazeres tradicionais, ou seja, o membro da comunidade que tem grande relevância para a consolidação da cultura popular“. Nas cidades escolhidas, esses mestres eram reconhecidos pela comunidade, que davam muita importância aos trabalhos desenvolvidos pelos artesãos.

Desafios

Um dos grandes desafios para a atividade do artesanato diz respeito às limitações de gestão, além da transmissão dos saberes. “Eles realizam bem a arte do artesanato, alguns deles conseguem fazer a transmissão do seu conhecimento para as futuras gerações, contudo, não sabem comunicar sobre o seu produto para além de suas comunidades, nem gerenciar finanças ou até tornar sua arte rentável”, afirma Rodrigo.

Essa falta de conhecimento na gestão criativa, no entanto, não compromete a identificação do ofício de artesão enquanto elemento identitário da comunidade. “Os mestres são reconhecidos nas cidades. As pessoas os identificam como mestres e sabem da importância de passar para as novas gerações o oficio de artesão,isso sim é importante para que essa cultura não desapareça”.

A transmissão de saberes

A pesquisa também considerou que uma das dificuldades para a consolidação da cultura popular, mais precisamente do artesanato, é a forma como esses saberes podem ser disseminados para as crianças e jovens das comunidades. No caso da região sisaleira, ainda existe interesse em aprender o ofício, que é desenvolvido pelos mais velhos. Entretanto, a insuficiência na geração de renda acaba afastando um grande número de aprendizes, que em muitos casos, desenvolvem atividades paralelas como a agricultura.
Cela feita em couro pelo Mestre Joel (Tucano-BA) Foto: Divulgação

Pensando nessa transmissão de saber, os organizadores do projeto desenvolveram quatro oficinas de passagens de saberes, nas cidades de Araci, Barrocas, Ichu e Conceição do Coité. Elas envolveram os mestres artesãos identificados e contou com ampla mobilização nos municípios, com a divulgação nos meios de comunicação locais. Outro fator de risco para a continuação de oficio de artesão é a escassez da matéria prima. Segundo Rodrigo Maurício Soares, a causa para essa escassez está na prática mercadológica que é desenvolvida pelos grandes produtores de artesanato

O ofício

O ofício dos Mestres dos Saberes e Fazeres da Cultura Tradicional Popular do Estado da Bahia é regulamentado pela Lei 8.899/2003 e por meio de Decreto 9.101/2004. De acordo com o Instituto de Artesanato Visconde de Mauá, órgão fomentador do artesanato baiano, é reconhecido como mestre “o artesão que, com sua experiência e reconhecimento do saber e fazer tradicional, é reconhecido na sua comunidade e por segmentos como transmissor e fomentador desse saber”.
Mestre Tingo (Lamarão-BA) ao lado de uma de suas peças produzidas em barro – Foto: Divulgação CIAGS – UFBA

A pesquisa aponta uma grande diversidade de tipologias de artesanatos na Bahia, contudo, ela se ateve à identificação dos mestres nas áreas de cerâmica, madeira, couro, sisal e instrumentos musicais. As características dessas tipologias podem ser conferidas no catálogo “Mestres em artes e ofícios populares Território do Sisal/BA”.

*Nádia Conceição é jornalista, estudante de produção cultural da UFBA e bolsista da Agência Ciência e Cultura.

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