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Quem anda pelas ruas de Belém já deve estar acostumado a encontrar nas esquinas vários carrinhos e barracas vendendo todo tipo de comida, desde os lanches rápidos até os almoços mais completos e tradicionais. Pratos como vatapá, maniçoba, caruru, arroz paraense e tacacá são a principal pedida de quem se alimenta nesses locais. Não é à toa que, recentemente, Belém foi eleita pela Unesco como cidade criativa da Gastronomia. Esse é o tema da segunda reportagem do UFPA em Série – Belém 400 anos. Leia a seguir.
Em uma das mais movimentadas esquinas da cidade de Belém, em frente à Praça Santuário de Nazaré, no carrinho de lanches da paraense Vilda da Silva, que há três anos trabalha vendendo alguns dos principais pratos da culinária local, o prato mais pedido pelos consumidores é o vatapá, principalmente no almoço.
“Já de tardinha, sai mais o tacacá”, afirma a vendedora. Ela também conta que o mês de maior movimento é outubro, época em que o número de turistas aumenta na cidade por causa das festividades do Círio de Nazaré. “Nesse mês, a gente tem muito movimento, principalmente porque vem muita gente para conhecer Belém e aproveita para conhecer nossas comidas”, diz a vendedora.
Visando compreender essa dinâmica sociocultural na cidade e propor formas para incentivá-la foi que Álvaro Negrão do Espírito Santo escolheu como tema de sua tese de doutorado em Turismo, Lazer e Cultura, na Universidade de Coimbra, em Portugal, os sabores tão característicos da região amazônica, especificamente do Pará e, principalmente, de Belém.
No trabalho, o professor da Faculdade de Turismo da UFPA e atual coordenador do Programa de Desenvolvimento do Turismo do Estado do Pará (Prodetur), da Secretaria de Estado de Turismo do Pará (Setur), em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), fez uma ampla pesquisa - uma viagem - sobre os gostos, os pratos típicos e os lugares tradicionais de venda de comida na capital paraense. Daí o nome “Viagens e sabores na Amazônia brasileira: os territórios do turismo gastronômico em Belém do Pará”.
Durante as pesquisas para a tese, o professor concebeu um livro chamado A gastronomia do Pará: o sabor do Brasil, onde ele e o jornalista Fernando Jares Martins fazem um apanhado histórico sobre a gastronomia da capital paraense desde o século XVII até os dias atuais. O livro foi lançado em 2014, em Lisboa.
Peculiaridades - Para Álvaro Negrão, a gastronomia paraense e belenense, umas das mais peculiares do mundo, pode ser um fator de influência na escolha dos turistas que buscam por lugares diferentes e experiências novas. “Na hora de escolher o lugar que vão visitar, muitos turistas buscam por opções diferentes culturalmente e, num mundo tão globalizado, onde os costumes e práticas tendem à homogeneização, Belém se destaca por ser uma cidade com uma cultura única e peculiar, e a nossa gastronomia, por razões culturais e históricas, é diferente de tudo aquilo que existe no mundo, isso atrai os visitantes”, acredita.
Influências históricas - O professor assegura que a culinária paraense é única por ser resultado de diversas influências históricas e culturais sobre a região, ao longo de vários séculos. “Nossa comida é fruto das nossas matrizes portuguesas, que se juntaram à cultura africana, mas, sem dúvida, a principal influência vem dos indígenas, porque nossos hábitos alimentares e os produtos culinários guardam a herança dos habitantes autóctones do Pará”, destaca.
Álvaro Negrão diz, ainda, que as matrizes indígenas estão presentes até nos nomes dos pratos que comemos. “O pirarucu é um peixe que já era consumido antes da colonização na Amazônia. O nome, em tupi, é uma junção dos vocábulos pirá (peixe) e urucum (tintura vermelha), por causa da coloração das escamas do peixe. Os portugueses inseriram no processo de tratamento do peixe a salga, que já era feita com o bacalhau norueguês, mas o nome foi mantido e o peixe é consumido até hoje”, conta.
Reconhecimento - Graças a essa gastronomia única, Belém foi condecorada, no dia 11 de dezembro de 2015, pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) como Cidade Criativa da Gastronomia, tornando-se, assim, uma cidade de referência mundial no ramo gastronômico. Além disso, a capital paraense prepara-se para implantação do Centro Global de Gastronomia e Biodiversidade da Amazônia, um projeto ambicioso que combinará Ensino Superior de Gastronomia, pesquisa científica com ervas e plantas medicinais, além de núcleos de prática gastronômica e atividades itinerantes.
No âmbito da UFPA, a principal contribuição para o fortalecimento da gastronomia regional será o Centro de Excelência de Comida de Rua, incluído no projeto de revitalização da Ladeira do Castelo, no bairro Cidade Velha. Esta iniciativa promoverá a qualificação para o preparo de insumos e pratos da culinária regional.
Catalisador para o turismo - Álvaro Negrão acredita que a gastronomia será um importante catalisador para o turismo no Pará, desde que a sociedade se organize na defesa da cultura gastronômica e que políticas públicas sejam instituídas, na defesa da culinária paraense. “Precisamos de políticas públicas de incentivo à gastronomia, porém, mais do que isso, precisamos que a sociedade civil saia em defesa da nossa cultura gastronômica, para que o orgulho que temos da nossa comida se transforme em valorização, tanto nacional quanto mundial”, conclui.
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Texto: Alesson Rodrigues - Assessoria de Comunicação da UFPA.
Fotos: Alexandre Moraes, Adolfo Lemos, Alesson Rodrigues e Divulgação
Arte: Rafaela André
Publicado em: 12.01.2016
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