segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Dia Nacional da Consciência Negra (20/novembro): entrevista

Do Boletim UFMG

"As diferenças genéticas entre  etnias são insignificantes"  

Entrevista de Alexandra Leite com Alan Templeton  

Encontrar um índio brasileiro não miscigenado ou mesmo um alemão puro da raça ariana é tarefa quase impossível. É o que se conclui do trabalho coordenado pelo biólogo norte-americano Alan Templeton, da Washington Universityof Saint Louis, que promete pôr fim ao conceito de raça, em nome do qual foram cometidas algumas das maiores atrocidades da história da humanidade. 

A pesquisa de Templeton comparou mais de oito mil pessoas de várias partes do mundo, entre elas índios ianomamis e xavantes do Brasil. "As diferenças genéticas entre grupos das mais distintas etnias são insignifi-cantes", afirma o pesquisador, que, apesar dos seus olhos azuis e cabelos louros, pode ter mais genes africanos do que o rei Pelé. Templeton, que esteve no ICB participando do IV Seminário de Ecologia Evolutiva, na semana passada, falou com exclusividade ao BOLETIM.

BOLETIM: Sua pesquisa parece cair como luva para quem quer entender o processo de miscigenação ocorrido no Brasil...

Templeton: Sim. Curiosamente, foi aqui no Brasil que, há mais de 20 anos eu senti - digo senti porque ainda não era algo científico, mas emocional mesmo - o quanto é arbitrária a divisão dos seres humanos em raças. Um professor da USP me contou que, numa viagem aos Estados Unidos, percebeu que lá, diferentemente do Brasil, as pessoas morenas ou pardas são consideradas negras. Foi aí que comecei a compreender que a classificação de pessoas em raças é feita a partir de uma vivência cultural. A definição de negro, para o brasileiro, é diferente daquela usada por quem mora no Alaska. O conceito de raça, ao contrário do que se acredita, não é biológico, mas cultural.

B: Se não existem raças, porque um negro norte-americano é tão diferente de um japonês ou de um índio maxacali?

T: Os genes, unidades que carregam todas as informações sobre o organismo de um ser humano, determinam as características físicas. Mas as partículas que definem a cor do cabelo ou o formato do rosto são tão poucas que perdem seu significado quando comparadas ao número total de genes. A cor da pele de uma pessoa pode representar uma adaptação biológica a certas condições geográficas ao longo de sua evolução. Na região de origem dos negros, por exemplo, o sol é bastante forte. Como o excesso de energia solar prejudica o organismo, a cor negra protege a pele contra os raios nocivos. Não importa se há diferenças na cor da pele, nas feições do rosto, na estatura ou origem geográfica. Geneticamente, somos todos iguais.

B: Seria possível, então, encontrar mais genes africanos num alemão "puro" do que em num negro nascido na África?

T: Sem dúvida. Às vezes, as diferenças mais gritantes aparecem entre indiví-duos de um mesmo grupo étnico, como os asiáticos. Os resultados da minha pesquisa demonstraram que, quando há diferença significativa, 85% ocorrem entre pessoas possuidoras das mesmas características físicas. Afinal, os nossos genes vêm de todas as partes. Já as diferenças entre os negros africanos e os brancos europeus, que serviriam de base para raças bem distintas, são de apenas 15%.

B: Os resultados da sua pesquisa podem contribuir para o fim do preconceito racial?

T: O preconceito é uma questão que preocupa o mundo inteiro. Se não existem raças, porque há discriminação? Não faz sentido achar que os negros são melhores ou piores que os brancos se os seus genes são praticamente os mesmos.

B: No Brasil, o IBGE divide os indivíduos em negros, brancos, pardos, amarelos e indígenas. Como será a divisão se o conceito de raça for extinto?

T: Quando começarem a se ver de maneira diferente, os seres humanos passarão a ser tratados como indivíduos e não só como membros de uma categoria. É lamentável que essas instituições ainda agrupem as pessoas de forma estanque. Reconheço que produzem estatísticas válidas para a definição de determinadas políticas públicas, mas no futuro a forma de se categorizar as pessoas terá de sofrer mudanças. Se é que essas classificações serão tão importantes assim.

Outros textos para reflexão

Newanalysis shows three human migrations out of Africa
Replacement theory ‘demolished’

Face Oculta do Racismo no Brasil: uma Análise Psicossociológica

Link:
https://www.ufmg.br/boletim/bol1212/pag5.html

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