sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Justiça Federal determina retirada de publicações na internet de conteúdo discriminatório a índios

Decisão liminar manda remover mais de 30 publicações no Facebook e fixa multa a ser aplicada caso novas notícias com o mesmo tom sejam publicadas

A Justiça Federal no Amazonas atendeu ao pedido de medida liminar feito pelo Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) em ação civil pública e determinou que o administrador da página Portal Apuí no Facebook, Ivanir Valentim da Silva, retire da página notícias com conteúdo discriminatório e incitação ao ódio contra os povos indígenas da etnia Tenharim, veiculadas desde dezembro de 2013.

De acordo com a decisão liminar, o administrador deve remover mais de 30 publicações, onde foram identificadas incitação ao ódio contra a etnia, incitação a práticas criminosas, generalização de responsabilidade por crime e discurso injurioso contra defensores dos direitos indígenas. Ele deverá ainda remover, das demais notícias veiculadas, os comentários que contenham ofensas, injúrias e conteúdo discriminatório contra os indígenas Tenharim.

Caso não cumpra a decisão no prazo fixado de 72 horas, continue a publicar notícias com tom discriminatório e ofensivo contra o povo indígena Tenharim ou não remova comentários com tom discriminatório e ofensivo no prazo máximo de 48 horas, o administrador deverá pagar multa diária de R$ 800.

A decisão liminar prevê também a intimação do Facebook, em São Paulo, determinando a retirada do conteúdo mencionado.

Conflitos e violência – A região do sul do Amazonas vive dias de instabilidade desde dezembro de 2013 em função da morte de um indígena e do desaparecimento de três pessoas na área da terra indígena Tenharim Marmelos, cortada pela rodovia Transamazônica (BR-230). Ainda no início dos conflitos, o MPF/AM identificou uma série de mensagens discriminatórias publicadas em páginas de redes sociais e portais de notícia da região e expediu recomendação com o objetivo de cessar a incitação à violência e discurso de preconceito contra indígenas da etnia tenharim.

Segundo a ação, em uma das mensagens divulgadas após o incêndio de prédios e bens públicos da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Humaitá e da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), o Portal Apuí escreveu “QUE PENA! Barquinho chique, camarote, TV de Plasma, muito luxo. Tudo cinza agora”, como legenda de uma foto do barco da Funai incendiado durante protestos que tinham os indígenas como alvo. Essa e várias outras postagens com mensagens de incitação à violência e satisfação com atos de destruição do patrimônio público federal foram coletadas pelo MPF desde o início dos fatos e anexadas à ação apresentada à Justiça.

Apesar de ter manifestado concordância com a recomendação em mensagens publicadas na página, o responsável pelo Portal Apuí continuou divulgando uma série de mensagens nas quais, entre outras atitudes, chama os indígenas de “bandidos” e reconhece a existência de “ódio contra os tenharim”.

Liberdade de expressão x práticas abusivas – Para o MPF/AM, o direito à liberdade de expressão é indispensável para o exercício da democracia, mas não foi criado de forma absoluta, sem restrições, e deve ser exercido com ponderação e garantia do contraditório. “A atividade jornalística não goza de liberdade plena, devendo ser compatibilizada a garantia constitucional com o respeito aos demais direitos fundamentais previstos na Constituição, notadamente aqueles que buscam fundamento direto no princípio da dignidade da pessoa humana”, ressalta um trecho da ação.

Nos argumentos apresentados à Justiça, o MPF também afirma que atribuir qualidades negativas discriminatórias a um grupo de indivíduos, como fez o jornalista processado, atinge a dignidade deste grupo perante a sociedade, o que constitui abuso do direito de expressar-se livremente. “Ao agir de forma que extrapola o âmbito de proteção do direito à liberdade de expressão/imprensa, surge a necessidade de remover os ilícitos causados, bem como de inibir o réu a adotar condutas similares no futuro”, defende o órgão em outro trecho do documento.

Ainda na ação civil pública, o MPF pede que, ao final da tramitação do processo, o administrador da página Portal Apuí seja condenado ao pagamento de indenização por dano moral coletivo, no valor de R$ 100 mil.

A ação continua tramitando na 1ª Vara Federal no Amazonas, sob o número 2206-34.2014.4.01.3200.

Fonte: Procuradoria da República no Amazonas

EcoDebate, 21/02/2014
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