sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Direitos Humanos e Direitos da Natureza, artigo de José Eustáquio Diniz Alves


[EcoDebate] O dia 10 de dezembro é a data de aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948. Este documento tem uma importância histórica incomensurável e se constitui em uma das páginas mais belas já escritas na trajetória humana sobre a Terra.

A Revolução Francesa pode ser considerada a “mãe” que deu origem ao rebento mais significativo dessa história. De fato, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovada pela Assembleia Nacional, no dia 26 de agosto de 1789, representou, em termos sociais, uma revolução copernicana. Segundo Norberto Bobbio, com a Revolução Francesa houve uma “inversão histórica”, em que “passou-se da prioridade dos deveres do súdito à prioridade dos direitos dos cidadãos”.

Desde as ideias iluministas do século XXVIII, mas, especialmente, nos últimos 65 anos da Declaração Universal (1948-2013) houve um grande avanço dos direitos humanos no mundo, embora a situação das desigualdades sociais e políticas esteja longe de ser a mais justa e ideal.

Porém, se existem muitas injustiças entre os seres humanos, as injustiças são muito maiores em relação aos direitos dos ecossistemas e aos direitos das demais espécies vivas da Terra. Como já escrevi em outro artigo, os Direitos Humanos não podem estar em contradição e em conflito com os direitos da Terra e os direitos da biodiversidade. Sem a biodiversidade não existiria vida humana. A humanidade não tem como viver em uma terra arrasada. Portanto, não é justo e nem viável o ser humano pensar em termos egoísticos e ignorar que a vida na Terra é uma aventura coletiva que envolve a diversidade da flora, da fauna e a geologia do planeta. É preciso ter uma atitude ética em relação aos demais seres vivos. Como afirma a Carta da Terra:

“A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, nosso lar, é viva como uma comunidade de vida incomparável. As forças da natureza fazem da existência uma aventura exigente e incerta, mas a Terra providenciou as condições essenciais para a evolução da vida. A capacidade de recuperação da comunidade de vida e o bem-estar da humanidade dependem da preservação de uma biosfera saudável com todos seus sistemas ecológicos, uma rica variedade de plantas e animais, solos férteis, águas puras e ar limpo. O meio ambiente global com seus recursos finitos é uma preocupação comum de todos os povos. A proteção da vitalidade, diversidade e beleza da Terra é um dever sagrado”.

Portanto, a dignidade e os direitos não são exclusividades dos seres humanos. É preciso romper com a ideologia antropocêntrica que considera os humanos donos da Terra e do sistema solar. Como mostrou o escritor Leonardo Boff:

“A Terra é um superorganismo vivo, Gaia, que se autorregula para ser sempre apta para manter a vida no planeta. A própria biosfera é um produto biológico, pois se origina da sinergia dos organismos vivos com todos os demais elementos da Terra e do cosmos. Criaram o habitat adequado para a vida, a biosfera. Portanto, não há apenas vida sobre a Terra. A Terra mesma é viva e como tal possui um valor intrínseco e deve ser respeitada e cuidada como todo ser vivo. Este é um dos títulos de sua dignidade e a base real de seu direito de existir e de ser respeitada como os demais seres”.

Respeitar os direitos intrínsecos das demais espécies significa colocar limites à presença humana na Terra. A ideia de limitar os direitos humanos pode parecer esdrúxula, mas deve ser pensada em termos de direitos mais amplos, direitos que envolvem a vida do Planeta e os direitos das demais espécies vivas da Terra. Assim, seria preciso aumentar os direitos entre os humanos e reduzir os direitos humanos em relação ao predomínio que esta espécie possui sobre o ambiente e as demais espécies.

Os Direitos humanos só serão efetivos quando se respeitar os direitos da nossa casa (Direitos da Terra) e dos nossos vizinhos (Direitos da biodiversidade). Como animais racionais e inteligentes, os seres humanos precisam reconhecer os danos que tem provocado à vida terrestre e reconhecer a natureza como sujeito de direito. A vida selvagem não pode ser eliminada pela civilização e a degradação dos territórios precisa ser revertida pela reselvageriação da vida animal e a expansão das áreas florestais.

Portanto, é preciso garantir os direitos humanos entre os humanos, mas, por questão ética e moral, esta espécie que domina o planeta, não deve desrespeitar os direitos da Terra e da rica vida da biosfera.

Referências:

ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos. 1948


Leonardo Boff. A Terra sujeito de dignidade e de direitos. 22/04/2010. 

ALVES, JED. Demografia, Democracia e Direitos Humanos, Texto para Discussão n. 18, ENCE/IBGE, Rio de Janeiro, 2005http://www.ence.ibge.gov.br/c/document_library/get_file?uuid=73ab957f-f21c-4d75-a00a-916a6fbdbaaf&groupId=37690208

ALVES, JED. Direito Reprodutivo: o filho caçula dos Direitos Humanos , APARTE – Inclusão Social em Debate, IE/UFRJ, Rio de Janeiro, 0612/2004

ALVES, JED. Direitos Humanos, Direitos da Terra e Direitos da Biodiversidade, Ecodebate, RJ, 12/01/2011

ALVES, JED e CAVENAGHI, S. Direitos sexuais e reprodutivos e a equidade de gênero: a Rio + 20 e a CIPD além de 2014. Ecodebate, Rio de Janeiro, 10/12/2012

Alberto ACOSTA y Esperanza MARTÍNEZ (Compiladores). La Naturaleza con derechos: filosofía y política. Ediciones Abya-Yala, Quito-Ecuador, Auspiciado por la Fundación Rosa Luxemburg, mayo de 2011

Declaración Universal de los Derechos de la Naturaleza

ANDA – Agência de Notícias de Direitos Animais. http://www.anda.jor.br/

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

EcoDebate, 06/12/2013

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