Por: Camila Gomes Victorino
As plantas alimentícias não-convencionais enriquecem os pratos com vida, nutrientes e ética e são facilmente cultiváveis (Na foto, salada com flores de capuchinha).
Fonte: Blog das flores
Apesar de não notarmos, nós costumamos comer sempre os mesmos alimentos, o que não é só ruim para nossa saúde, pois sempre ingerimos os mesmos nutrientes, como é ruim também para a agricultura familiar, para o bem-estar animal e para o envenenamento da terra.
Mas como isso?
Na realidade, os alimentos que estamos acostumados a comer são alimentos exóticos, que vieram de outros climas e ambientes e que, portanto não estão adaptados plenamente às condições climáticas e do solo de nosso país. Isso faz com que demandem mais cuidados e muitas vezes agrotóxicos e adubos químicos. Atualmente com a agricultura orgânica, muitas técnicas naturais foram desenvolvidas para lidar com a plantação destes alimentos, porém o vício que temos em sempre comprar os mesmos produtos faz com que muitas plantas nativas do Brasil ou das diferentes regiões geográficas, faça com que muito alimento seja ignorado, mesmo quando ele está presente no seu quintal, na sua rua, brotando como ervas, vulgarmente chamadas de daninhas.
Onde um olhar leigo vê apenas ervas daninhas, um novo entendimento pode ver alimentos brotando. Fonte: Cidadania lx
Estas plantas são tão bem-adaptadas ao clima que quase não precisam de cuidados, podendo ser plantadas em qualquer quintal ou apartamento. Sem necessidade de manejo, elas ainda aportam nutrientes que são raramente encontrados nos alimentos que costumamos comer, como proteínas, por exemplo, o que diminui ainda mais a necessidade por proteínas de vegetais exóticos, como soja, ou de animais na alimentação.
Uma dessas plantas é a Ora pro nobis, uma cactácea que apresenta folhas comestíveis, rica em proteína. Antigamente, ela era conhecida como “carne dos pobres”, pois era a única fonte de proteínas da população miserável de nosso país. Hoje ela está esquecida e é raro encontrar em feiras. Fácil de cultivar, ela - sendo arbustiva - pode render alimento para o ano todo, suas folhas podendo ser refogadas como couve, batidas para formar patês, junto com tofu, ou comidas na salada e batidas no suco verde. Além dela, existe ainda a taboa, aquela planta que as crianças costumam chamar de “arvore de salsicha” A taboa, pasmem, é comestível, seus caules podendo ser colhidos e dele retirado o palmito para conservas. Além disso, sua inflorescência (a salsicha) contém grande quantidade de pólen que pode ser usado como cereal no café da manhã, misturado a massas de pães e bolos.
O caruru dá grãos similares ao da quinua e é facilmente encontrado nas ruas das cidades. Fonte: Augustoperchi
Fora estas duas plantas não convencionais, há ainda uma variedade de vegetais que nem imaginamos ser comestíveis! A lista é gigantesca e vou falar aqui de mais três delas, deixando uma lista de outras plantas que encontrei em minha pesquisa para que vocês mesmos experimentem, caso as encontrem em locais seguros (neste caso locais limpos, fora do alcance de animais, de água suja e poluição).
Uma planta que está começando a ser comercializada e que é muito rica em vitaminas e minerais é a Taioba. A Taioba é uma planta que apresenta longas folhas verdes ricas em ferro e que podem ser refogada como couve. Além das folhas, a taioba forma tubérculos, que podem ser comidos cozidos, como batata ou inhame. Outra planta não convencional é o caruru. O caruru é aquela plantinha rasteira, sempre conhecida como erva daninha e que produz uma espiga com cheiro de tempero. O caruru, para quem não sabe, é parente da quinua e suas sementinhas podem ser comidas cozidas ou como cereal matinal. Por fim, eu cito uma última planta muito interessante que é a Beldroega. A beldroega é uma rasteira que produz flores rosas pequeninas com sementinhas cor de rosa ou amarelas. Suas folhas podem ser comidas refogadas ou em saladas, sendo seu cultivo praticamente espontâneo, pois ela se adapta facilmente a qualquer tipo de solo.
Uma folha de taioba rende grande quantidade de alimento. Fonte: Come-se
Eu imagino que para alguns, foi uma grande surpresa constatar que algumas plantas que brotam em seu quintal ou mesmo em sua rua podem ser utilizadas como alimento. Disponibilizarei uma lista abaixo com outras plantas e seus nomes científicos e um vídeo sobre plantas alimentícias não convencionais. Além delas, eu imagino que com a tamanha biodiversidade brasileira devam existir várias outras que podem substituir plantas exóticas que precisam de grandes insumos, quantidade de água e cuidados.
Nossa alimentação é centrada naquilo que aprendemos! Desta maneira, nós comemos arroz, feijão e carne, mais alface porque nossos pais nos ensinaram assim e nunca pensamos que poderia ser diferente!
Variar sabores e optar por alimentos orgânicos e nativos é também cuidar do planeta. Fonte: ssmfoto
Está na hora de rever estes conceitos e abrir o paladar para outras fontes de minerais, carboidratos, vitaminas, lipídeos e proteínas! A ânsia por alguns alimentos é muitas vezes mais imposição cultural do que verdadeira necessidade nutricional! Já pensou nisso? Assim como eu falo sempre sobre o vegetarianismo e sobre a possibilidade de se tornar vegano, sem que adoeçamos, aqui eu exponho como a natureza pode nos beneficiar, em qualquer região, com alimentos ricos, sem que para isso tenhamos que destruir a terra ou a vida dos animais.
Espero que a partir de agora sua vida alimentar fique ainda mais rica! Eu já experimentei várias destas plantas e pode apostar que são uma delícia quando bem preparadas!
Paz!
Quem ja não brincou com as seralhinhas quando criança? Fonte: Vida nos bosques
LISTA DE PLANTAS ALIMENTÍCIAS NÃO-CONVENCIONAIS
Abóbora do mato (Melotria pendula) – somente os frutos verdes devem ser comidos, em saladas, por exemplo;
Aroeira pimenteira (Schinus terebinthifolia) – os frutos são a conhecida pimenta rosa;
Beldroega pequena (Portulaca oleracea) – folhas para sucos, sopas e saladas. É também medicinal;
Beldroega grande (Talinum paniculatum) – como a beldroega pequena suas folhas são usadas em saladas, sopas e sucos;
Bertalha coração (Anredera cordifolia) – suas folhas podem ser refogadas ou usadas em saladas. Seus tubérculos aéreos são usados cozidos como batata;
Capuchinha (Tropaeolum majus) – suas flores são usadas em salada e suas folhas em saladas e sucos verdes;
Caruru (Amaranthus viridis L.) -parente da quinua – usam-se as folhas para saladas, refogados, recheios e patês; as sementes são usadas cozidas ou torradas, em recheios e como cereal;
Dente de leão (Taraxacum officinale) – é uma planta medicinal estimulante, digestiva e depurativa. Suas folhas podem ser comidas em saladas ou batidas em sucos verdes;
Hibiscus (Hibiscis sp.) – Apesar da origem africana, adaptou-se ao clima do país. De suas flores é feito o chá ou suco muito nutritivo. Suas sementes são ricas em proteínas e dela feita uma farinha que pode ser adicionada ao feijão. Seus frutos também são comestíveis;
Jaracatiá / mamoeiro do mato (Jaracatiá spinosa)– parente do mamoeiro. Seus frutos fazem geleia e são muito apreciados quando maduros;
Língua de vaca/ azedinha (Rumex acetosa) – folhas apreciadas na salada. Não devem ser comidas em excesso pela presença de ácido oxálico;
Mamãozinho / Jaracatiá (Vasconcella quercifolia) – seus frutos maduros são comestíveis e do seu caule é feito o doce ralado de jaracatiá;
Ora pro nobis (Pereskia aculeata) – suas folhas são usadas refogadas, em sucos verdes, patês e saladas. Suas folhas secas podem ser usadas como orégano ou como farinha. Deve-se tomar cuidado ao colher, pois possui espinhos. São ricas em ferro, proteínas e cálcio;
Pepininho do mato (Melothria cucumis)- produz pepinos pequenos que podem ser comidos em saladas e usados para fazer picles;
Pêssego do mato (Eugenia myrciantes) – fruto;
Picão / carrapicho (Bidens pilosa) – mais uma planta cujas folhas podem ser usadas em saladas;
Serralha (Sonchus oleraceus) – usam-se as folhas como salada e refogadas; rica em vitamina A, D e E é similar ao espinafre;
Serralhinha / flor de pincel (Emilia fosbergii Nicolson) - folhas podem ser usadas em saladas e sucos verdes. Seu chá é útil contra infecções urinárias. Suas flores também são comestíveis e usadas em risotos, saladas, sopas etc;
Taboa (Typha domingensis)- os brotos e centro do caule podem ser usados como palmito; das inflorescências tira-se o pólen que pode ser usado como cereal e em massas de pães e bolos; pode-se comê-lo cru. Por fim, a raiz pode ser cozida e tem o mesmo teor de proteína do milho e batata. NT: não colha taboas por aí, pois ela absorve metais pesados da água. Certifique-se que a água próxima das taboas é potável;
Taioba (Xanthosoma sagitifolium) – planta de sub-bosque, gosta de sombra e se adapta bem a sistemas agroflorestais. Suas folhas podem ser comidas refogadas; seus tubérculos podem ser usados como mandioca ou inhame;
Tanchagem / tanchagem (Plantago major) – usam-se as folhas como salada e refogadas. É também usada como planta medicinal, como infusão no caso de ardor no estômago e cataplasma para feridas na pele, acnes e picadas de inseto;
Urtiga / Cansanção (Urtiga dioica) – usam-se as folhas somente refogadas, jamais cruas.
Para saber mais: KINUPP, V. Plantas alimentícias não-convencionais da região de Porto Alegre. Clique aqui para baixar a dissertação de doutorado.]
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